29 de julho de 2012

Ônus enquanto não dissolvida sociedade informal



2ª Vara Judicial da Comarca de Espírito Santo do Pinhal
Autos nº 1276/2010                                                        
Autores:                   A, B e C                                 
Réu:                          Espólio D

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos.
1. Relatório:
Os autores ajuizaram pretensão de ressarcimento em relação a metade das despesas havidas em haras que mantinham e mantêm em sociedade com D e E (agora respectivos espólios, em razão dos óbitos) no período compreendido entre os anos de 2005 e 2009. Narraram para tanto que fizeram ajuste de que a partir de 2005 as despesas deveriam ter sido rateadas na proporção de metade para cada pólo processual, não tendo havido pagamentos pelo pólo passivo (fls. 2-7).
O espólio D apresentou contestação alegando ilegitimidade ativa, ilegitimidade passiva e contrariando o mérito sob o argumento de exceção do contrato não cumprido em razão de que os autores não pagaram os valores anteriores ao ano de 2005 (valores esses que teriam sido suportados na integralidade pelo pólo passivo), aduzindo ainda que nada receberam pela suposta sociedade, que não usufruíram dos bens e que os gastos cobrados não foram autorizados pelo espólio (fls. 3788-3793).
Houve réplica (fls. 3819-3823).
O processo foi saneado (fls. 3829-3830).
Na presente audiência houve depoimento pessoal do autor B, interrogatório da administradora de fato do espólio e inquirição de duas testemunhas do pólo ativo.
É o relatório. Decido.

2. Fundamentação:
Os elementos já coligidos aos autos pelo próprio pólo ativo são mais do que suficientes a tornar inexorável a conclusão de que a pretensão inicial não prospera.
As partes são legítimas a figurar nos respectivos pólos processuais, pois está bem claro que em razão de ter sido realizada uma sociedade familiar, houve confusão patrimonial entre as empresas e os membros efetivos da sociedade (B, D e E). Em razão da confusão patrimonial e da sociedade de fato que se estabeleceu, não há como recusar legitimidade a qualquer das partes, pois todos estão diretamente envolvidos no litígio.
Quanto ao mérito, de início há de se ver que tendo a demanda sido aforada em 14.12.2010, todos os valores cobrados em período anterior a 15.12.2007 estão atingidos pela prescrição (artigo 206, § 3º, do Código Civil).
De todo modo, a integralidade dos valores não pode ser objeto de cobrança.
Primeiro. É sintomático que a parte autora somente tenha ingressado com a demanda depois da morte de E. Essa circunstância já traduz que ou houve mesmo o ajuste entre as partes de que o autor B a partir de 2005 arcaria com a integralidade das despesas do haras (o que impede a cobrança pretendida) ou que no mínimo havia um ajuste tácito de E tolerar arcar sozinho com as despesas, o que acabou por gerar a supressão do seu direito de cobrança (supressio).
Segundo. O documento de fl. 24, trazido pelos próprios autores, demonstra de modo insofismável que até 16.3.2005 o pólo ativo do presente feito não contribuiu com qualquer das despesas do haras. Assim, e como os irmãos X não abdicaram formalmente da dívida, não pode ser desconsiderado que havia efetivamente dívida pretérita, dívida essa que não foi abatida na inicial e que também não foi objeto de prova documental de pagamento (prova essa que também já deveria ter sido produzida por ocasião da réplica, pois não se tratam de documentos novos e eram eles necessários para a contraposição aos argumentos da contestação). E os irmãos X nem poderiam abdicar da dívida em detrimento dos demais herdeiros integrantes do espólio, pois como a abdicação da dívida aproveitaria diretamente uma herdeira (pois B era genro de E), essa “antecipação de herança” somente poderia ocorrer por intermédio de documento escrito e que contivesse a anuência de todos os herdeiros, ou que houvesse expressa (e também escrita) ressalva de que essa antecipação seria deduzida da parte disponível da herança.
Terceiro. Com a morte de dois dos sócios e sendo a sociedade constituída de modo informal, cabia principalmente ao sócio remanescente (B) providenciar a dissolução da sociedade de fato, com a apuração dos haveres, das dívidas e a divisão do patrimônio. Assim não agiu e continuou atuando como gestor exclusivo da sociedade. Nesse contexto, não há dúvidas de que ao assumir para si a exclusiva gestão da sociedade incidente sobre o haras, passou a correr por sua conta e risco toda e qualquer despesa, eis que estava agindo também de modo informal e sem regularização da dissolução da sociedade.
Quarto. Mesmo sendo elevadíssimos os gastos com a manutenção do haras, até a presente data os autores não providenciaram o procedimento apropriado à dissolução da sociedade, o que faz lançar severas dúvidas sobre a efetiva existência de patrimônio deficitário.
 Quinto. Nenhum dos herdeiros integrantes do espólio D praticou qualquer ato de gestão do haras, não tendo eles, por conseguinte, assumido divisão de responsabilidades.
Sexto. Nenhum dos herdeiros integrantes do espólio frequenta, faz uso gratuito ou efetivamente goza do haras. A integralidade do haras está sob o poder dos autores. Uma das testemunhas dos próprios autores (L) narrou que B não autorizou sequer que ele acompanhasse um avaliador até o bem para que houvesse avaliação a ser repassada para o espólio. E se os autores tolhem o livre exercício da propriedade pelo pólo passivo, quando menos precisariam arcar com uma contraprestação pecuniária a esse respeito (a título de aluguel). E em nenhum momento consta notícia de que isso tenha ocorrido. Nessa esteira, ainda que houvesse crédito passível de cobrança pelo pólo autor, no mínimo da cobrança precisaria ser deduzida quantia suficiente a ressarcir o pólo passivo por ter seus poderes de proprietário tolhidos pelos autores. E a considerar pela dimensão do haras, ao que tudo aponta um eventual valor a esse título ficaria abaixo do valor do gasto mensal com as despesas do haras.
Sétimo. Mesmo depois do falecimento dos outros sócios, em nenhum momento os autores se ocuparam de requerer a autorização dos integrantes do espólio para a realização dos gastos e isso era necessário não apenas por eles serem titulares de direitos decorrentes da sociedade, como porque nenhum deles elegeu B como o administrador do haras. E quem age por conta própria sem autorização dos demais titulares de direitos, deve arcar sozinho com as despesas daí decorrentes.
Oitavo. Os negócios realizados entre os sócios originais (B, D e E) foram entabulados de modo informal e sem qualquer documentação hábil a demonstrá-los de forma efetiva, não sendo possível aquilatar com precisão as exatas obrigações e deveres de cada qual dos sócios. Um negócio assim (e principalmente por ter se tornado problemático já a partir de 2005, pois os autores alegam que desde então estariam sofrendo com o pagamento integral das despesas) é ruinoso para todos os envolvidos. Em razão dessa ruína para todos, a melhor solução é que cada qual arque com as consequências de sua informalidade. Ou seja, que os autores arquem com as despesas que têm com o haras, e que o espólio réu arque com a supressão do gozo de seu direito de propriedade sem qualquer contraprestação econômica a tanto.
Nono. As despesas havidas não foram com a mera manutenção (despesas necessárias) do haras. As despesas foram muito além e repercutem em gastos que não eram essenciais. E é de todo sabido que despesas não essenciais sem autorização dos demais proprietários não são passíveis de ressarcimento (máxime no caso, em que o haras passou a receber uma gestão informal sem a necessária dissolução da sociedade).
Em resumo, nenhuma das partes pode se beneficiar de seu procedimento desidioso para com a solução da situação. O que precisam é dissolver e dividir o patrimônio decorrente daquela sociedade que inicialmente se estabeleceu entre B, D e E.
3. Dispositivo:
Diante do exposto, e extinguindo o processo com resolução de mérito (art. 269, inciso I, do CPC), JULGO IMPROCEDENTE a pretensão consubstanciada na inicial.
Considerando que a parte autora foi sucumbente, condeno-a ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios em favor da patronesse do espólio réu, honorários esses que fixo por apreciação equitativa em R$ 30.000,00, tendo em vista o tempo dispensado para a causa, os valores envolvidos no litígio e que a nobre profissão da advocacia merece ser bem remunerada em casos vultosos como o presente.
Sentença publicada em audiência. Dou as partes por intimadas. Registre-se.

2 comentários:

  1. Maria Carolina Vidolin Marques31 de julho de 2012 às 11:03

    Nunca vi honorários de sucumbência em R$30.000,00 (hohohoho) =)
    Beijo!!!!

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  2. Oi querida irmã!
    Esses dias li uma frase interessante: "honorários não são gorjeta"...

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