6 de outubro de 2012

Empreendimento de turismo


1ª Vara Judicial da Comarca de Socorro
Autos nº 563/2010              
Autor:                       G
Réus:                        A
                                 B
                                 C e
                                 D

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos.
1. Relatório:
G ajuizou pedido pretendendo a outorga da escritura pública definitiva com relação à compra de parte ideal de imóvel, de indenização por danos materiais e por danos morais, em razão de que os réus descumpriram com sua obrigação contratual de após a conclusão do procedimento de retificação de área realizar a outorga da escritura (fls. 2-7).
O pólo passivo apresentou defesa sustentando preliminares de ilegitimidade, carência e inadequação, bem como contrariando o mérito sob o argumento de que não houve recusa na outorga da escritura (porque sequer teriam sido notificados), de que o autor não cuidou de pagar os tributos referentes à sua parte ideal e aduzindo não estarem presentes danos materiais e morais (fls. 153-156).
Houve réplica (fls. 153-156).
O processo foi saneado, com afastamento das preliminares de inadequação e ilegitimidade (fls. 153-156).
Durante a instrução foram inquiridas três testemunhas (fls. 186-191, 192-197 e 198-201).
As partes apresentaram alegações finais (fls. 206 e 211-213).
É o relatório. Decido.

2. Fundamentação:
Rejeito a preliminar de carência. Os pedidos do autor encontram interesse processual, pois a parte ré apresentou resistência ao pedido de outorga da escritura (incorrendo, pois, em mora pelo menos desde a citação) e mesmo durante o curso do processo em nenhum momento cuidou de providenciar a outorga da escritura definitiva.
Quanto ao mérito, a pretensão é parcialmente procedente.
A obrigação de fazer é devida. As partes firmaram negócio jurídico (fls. 9-10) e o autor pagou a integralidade do preço, não havendo qualquer razão justa ou substancial que impeça os réus de outorgarem a escritura definitiva. A ausência de pagamento proporcional dos tributos incidentes sobre a área não é obstáculo à outorga da escritura definitiva, pois caso não venha a ocorrer pagamento pelo autor, podem os autores manejar a demanda apropriada para pretender tal ressarcimento, sendo que os tributos relativos a imóvel rural são relativamente baixos em comparação com os valores dos imóveis, não podendo os réus tentar impedir a outorga de escritura do negócio substancial e adimplido em função de suposta dívida que se afigura como pífia diante do negócio principal.
Os danos materiais não estão presentes. Muito embora os réus tenham agido muito mal em não outorgar a escritura definitiva tão logo foi encerrado o procedimento de retificação de área (providência que lhes incumbia por força da cláusula quinta do contrato), fato é que não há qualquer indício de que o autor fosse efetivamente conseguir milionária linha de crédito para explorar o bem. O autor não tinha outros bens que pudesse dar como garantia do financiamento, o valor do imóvel na época não era expressivo a ponto de viabilizar financiamento milionário (valendo observar que pelo bem foi paga pelo autor a quantia de oitenta mil reais) e o autor não tem renda declarada que seja viabilizadora de vultosos financiamentos. De lá para cá o imóvel foi valorizando e persiste útil. Ainda há pessoa interessada em adquirir o bem (como retratou a testemunha inquirida às fls. 192-197). E também não se pode olvidar que as informações sobre o procedimento de retificação de área eram públicas, sendo que a qualquer momento poderia o autor ter diretamente diligenciado a verificação da sua fase, tendo, porém, ficado inerte por expressivo período de tempo.
Ocorrem danos morais.
A conduta dos réus extrapola em muito o mero inadimplemento contratual.
O autor foi feito de tolo, pois os réus eram sabedores de sua expressa obrigação contratual e mesmo diante do desfecho do procedimento de retificação de área insistiram em não outorgar a escritura, quando assim poderiam ter realizado com relativa simplicidade desde o tempo do encerramento do procedimento de retificação de área.
Os réus foram tão impertinentes e recalcitrantes que mesmo no curso do presente processo (que já perdura por mais de dois anos) permaneceram insistindo em não outorgar voluntariamente a escritura, a qual até hoje não foi passada, mesmo tendo recebido a integralidade do preço ajustado.
Nesse contexto, há no mínimo omissão grave (negligência que beira ao dolo) por parte dos réus, hábil a atrair a necessidade de responsabilização civil. Os danos morais decorrem do fato de que as condutas dos réus foram extremamente aviltantes ao autor, tendo ele sido tratado com desídia ímpar, modo esse de tratamento que merece ser reprimido e que é intolerável para os padrões exigíveis de probidade social.
Prossigo, então, com a mensuração dos danos morais.
Considerando que a fixação deve ser suficiente a recompensar o lesado (sem ser irrisória e, ao mesmo tempo, sem se constituir em causa de enriquecimento indevido), bem como sopesando no caso as condições econômicas dos réus e do autor, a intensidade das ofensas (que foram múltiplas, persistiram durante anos e se estendem até o presente) e a suficiência para coibir a reiteração de condutas semelhantes, reputo coerente e proporcional a mensuração do valor para reparação dos danos morais na quantia de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).
3. Dispositivo:
Diante do exposto, extinguindo o processo com resolução de mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão inicial, para os efeitos de:
(a) IMPOR aos réus a obrigação de outorgar em favor do autor escritura pública de compra e venda da parte ideal de imóvel, nos moldes do compromisso particular de venda e compra quitado (fls. 9-10). E
(b) CONDENAR os réus a solidariamente pagar ao autor reparação civil por danos morais no montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), com correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, ambos contados a partir da presente data (momento em que o valor foi arbitrado).
Considero que as partes foram sucumbentes em extensões equivalentes. Assim, tenho por presente a sucumbência recíproca, de modo que ficam compensados os honorários advocatícios, nos moldes do artigo 21, caput, do CPC e do disposto na Súmula n. 306 do Superior Tribunal de Justiça. Cada pólo deverá arcar com metade das custas processuais.
Concedo a tutela liminar da prestação específica. É relevante o fundamento da demanda, pois os documentos encartados ao feito demonstram o direito do autor em obter a obrigação de fazer, tanto que já recebeu provimento meritório a esse respeito em primeiro grau de jurisdição. Existe justificado receio de ineficácia do provimento final, o que é intrínseco à modalidade da pretensão, pois a cada dia que passa é um agravamento do quadro de desídia a que o autor foi submetido pelos réus. Destarte, com esteio no artigo 461, § 3º, do Código de Processo Civil, concedo medida liminar para o efeito de determinar aos réus que no prazo de trinta dias (contados da intimação da presente decisão) providenciem às suas expensas a outorga de escritura pública de compra e venda da parte ideal de imóvel, nos moldes do compromisso particular de venda e compra quitado (fls. 9-10), sob pena de multa (punitiva) no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a incidir de uma única vez. Caso não ocorra o cumprimento no prazo assinalado, além da incidência da multa, poderá o autor requerer ao juízo a fixação de prestação equivalente. Intimem-se por correspondência os réus para que deem cumprimento a presente tutela liminar.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Socorro, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

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