17 de outubro de 2011

invalidade de cobrança de ISSQN de profissionais liberais



Autos nº 002/2006
Vistos, etc.
Cuidam os autos de execução fiscal municipal de ISSQN.
O executado apresentou manifestação nos autos aduzindo que apenas a duras penas conseguiu realizar alguns recolhimentos de ISSQN, pois o seu mercado profissional passou por dificuldades, não tendo bens para solver a dívida exequenda (fls. 27-28).
A fazenda pública municipal apresentou contrariedade (fl. 40).
É o relatório. Decido.
Efetivamente, a matéria ventilada pelo executado não elide a execução e tampouco a peça apresentada se reveste das formas previstas para defesa.
Todavia, entendo haver questão envolvida no caso que deve ser conhecida de ofício e de plano, sem dilação probatória, de modo que pode ser apreciada nos próprios autos da execução e até mesmo sem qualquer defesa por parte do pólo executado.
É certo que o município pode instituir ISSQN sobre serviços de profissionais autônomos, nos moldes da competência disposta no artigo 156, inciso III, da Constituição da República.
Todavia, reputo que a incidência de ISSQN sobre serviços prestados por profissionais liberais tem o condão de violar os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, alçados como fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro (art. 1º, inciso IV, da CRFB), além de ensejar bitributação.
Explico.
São bem diferentes as prestações de serviços por sociedades profissionais ou empresas daquelas prestadas por profissionais liberais.
Nas sociedades profissionais e empresas a carga tributária incidente é considerada no custo da produção e acaba sendo repassada ao consumidor dos serviços, na medida em que o preço do serviço é calculado já incluindo os custos, as despesas tributárias e a margem de lucro. Por isso, mesmo diante da incidência de imposto de renda não acaba por ocorrer bitributação, eis que a despesas com o ISSQN não chegam a ser experimentadas diretamente pela empresa ou sociedade profissional, já que resulta repassada ao consumidor. E esse modo de agir das empresas ou sociedades profissionais não pode ser tido por injusto, pois é intrínseco ao mercado e ao capitalismo, não sendo elas obrigadas a desempenhar seus trabalhos de modo gratuito à população e ao consumidor em geral; o lucro precisa estar presente e, por isso, tudo é computado na formação do preço do serviço.
Já o mesmo não ocorre com os profissionais liberais. Os profissionais liberais, dentre eles os advogados (como em outros casos em trâmite neste juízo) e os pedreiros (como na espécie), não têm por padrão a consideração na formação do preço do serviço dos custos operacionais e muito menos da carga tributária incidente. Limitam-se eles a atribuir a seus serviços preços que reputam justos de acordo com as condições do cliente e a natureza do serviço. Por conseguinte, a carga tributária (e o ISSQN) acaba não sendo repassado ao cliente. Ou seja, a carga tributária não é englobada na formação do preço do serviço.
Por isso, entendo que o ISSQN tem o condão de onerar ainda mais os profissionais liberais (contribuintes já combalidos diante da excessiva carga tributária brasileira, que se encontra dentre as maiores do mundo), contrariando a lógica do mercado capitalista vigente, porquanto acabam sendo eles quem de fato sofrem com o efetivo recolhimento do tributo, não tendo o tributo sido embutido na anterior formação do preço do serviço cobrado do cliente.
E é nessa esteira que tenho que a tributação dos profissionais liberais com o ISSQN tem o condão de vulnerar os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, pois sua incidência acaba por impor aos profissionais liberais a execução quase que gratuita de seus serviços, na medida em que avança sobre a parte do preço do serviço que deveria corresponder ao lucro do profissional liberal.
E como decorrência disso acaba ainda surgindo odiosa bitributação, porquanto o lucro do profissional liberal acabe sendo consumido tanto pelo ISSQN quanto pelo imposto de renda.
Em conclusão, tenho como inválida perante a Constituição da República a incidência da ISSQN em relação a serviços executados por profissionais liberais.
Assim, conhecendo de ofício da questão, JULGO EXTINTA a presente execução fiscal n. 002/2006.
Como a execução apesar de ter sido extinta não o foi motivada por defesa do executado, considero presente uma forma de sucumbência recíproca, de modo que ficam compensados os honorários advocatícios, nos moldes do artigo 21, caput, do CPC e do disposto na Súmula n. 306 do Superior Tribunal de Justiça.
Decisão não sujeita a reexame necessário (CPC, art. 475, § 2º).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Pariquera-Açu, autodata.
AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

Um comentário:

  1. Ótima contribuição para a matéria de Direito Trbutário, a qual estou cursando este semestre...

    Taís.

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