31 de outubro de 2011

Consumidor: clonagem de cartão


Juizado Especial Cível do Foro Distrital de Pariquera-Açu
Autos nº 120/2011
Autor:                       E
Réu:                          Banco X

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos, etc.
1. Relatório dispensado (art. 38, caput, da Lei nº 9.099/95). Decido.
2. É viável o julgamento antecipado diante da expressa manifestação das partes no sentido de que não têm provas testemunhais a produzir (art. 330, I, do CPC).
Rejeito a questão preliminar defensiva. Ainda que terceiro não identificado tenha realizado o saque, o exame das assertivas contidas na inicial traduz a legitimidade do réu para figurar no pólo passivo, pois ao banco foram imputadas a prestação de serviço sem a segurança que dele se espera e a conduta aviltante ensejadora do pedido de dano moral. Ademais, como se verá adiante, existe mesmo responsabilidade imputável ao réu.  
Quanto ao mérito, as pretensões iniciais são parcialmente procedentes.
Nada há a se declarar inexigível, pois não há dívida pendente de pagamento pelo autor. Também não incide repetição de indébito (tampouco em dobro) em virtude de que não houve propriamente uma cobrança realizada pelo réu contra o autor, até porque a quantia indevidamente sacada não reverteu em benefício econômico ao réu.
Mas ocorre a necessidade de reparação civil.
Não há nos autos indício (e muito menos prova a esse respeito) de que o autor tenha cedido voluntariamente o cartão e a senha a terceiro, o que exclui a possibilidade de culpa exclusiva da vítima. Por conseguinte, resta traduzido que se está diante de caso de clonagem de cartão.
Nesse contexto, e como houve saque em caixa eletrônico disponibilizado pelo réu aos consumidores, apenas poderia evitar a responsabilização caso comprovasse que não houve qualquer defeito de segurança no serviço prestado. E tal prova incumbia ao réu, pois além de ser matéria de defesa (tendente a elidir a responsabilidade), na espécie se tem por verossimilhantes as alegações do autor (eis que chega a ser notória a possibilidade de clonagem de cartões, além da circunstância de que não há quaisquer indícios de que o autor esteja tentando se locupletar indevidamente), o que torna aplicável até mesmo o disposto no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).
Mas não é só, a prova cabia ao réu também pela distribuição dinâmica do ônus da prova (pois tal prova apenas seria possível à própria instituição financeira) e, mais, pela teoria do risco da atividade, eis que é cediço que o réu deve suportar os riscos dos serviços prestados quando estes serviços lhe trazem vantagens. E os caixas eletrônicos inegavalmente trazem inúmeras vantagens às instituições financeiras, eis que além de substituir a mão de obra humana e seus consectários legais (notadamente de índole trabalhista) ainda lhe tornam mais atrativas aos consumidores em virtude de ampliar o alcance aos serviços (permitindo incremento da clientela). Desse modo, se os caixas eletrônicos e cartões magnéticos trazem bônus para as instituições financeiras, devem elas também suportar os ônus inerentes a tais serviços. É a correlação entre o bônus e o ônus (teoria do risco/proveito).
Assim, e como o réu não produziu qualquer prova de que os métodos de segurança empregados em caixas eletrônicos são suficientes a impedir por completo qualquer desfalque ao consumidor, torna-se inafastável a sua responsabilidade em ressarcir ao consumidor a quantia indevidamente sacada.     
E os danos morais também estão presentes. Não pelo saque indevido em si, mas pela conduta mantida pelo réu depois de tomar ciência do saque indevido e sua atuação desidiosa em ressarcir o autor. De fato, o calvário pelo qual o autor precisou passar para ter reconhecido seu direito, quando deveria tê-lo tido prontamente atendido quando procurou pelo réu ainda extrajudicialmente, tendo recebido tratamento que além de desidioso evidencia que a sua própria idoneidade restou posta em dúvida pelo réu, são elementos suficientes a tornar claro que os transtornos transbordaram o mero dissabor, passando a atingir e a ofender a própria dignidade do autor.       
Desse modo, considerando que a fixação do valor da reparação moral deve ser suficiente a recompensar o lesado (sem ser irrisória e, ao mesmo tempo, sem se constituir em causa de enriquecimento indevido), bem como sopesando no caso as condições econômicas do réu (sólida e lucrativa empresa), a intensidade das ofensas (cujos efeitos repercutem até a atualidade, já durando mais de um ano) e a suficiência para coibir a reiteração de condutas semelhantes (pois deve ser conferido tratamento digno e eficaz a todos os consumidores dos serviços prestados), bem como o valor envolvido no saque indevido, reputo coerente a mensuração do valor para reparação dos danos morais na quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais).
3. Diante do exposto, julgo procedente em parte a pretensão inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (CPC, art. 269, inciso I), para os fins de:
(a) CONDENAR o réu a ressarcir o autor na quantia de R$ 800,00 (oitocentos reais), com correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, ambos contados desde 20 de julho de 2010 (data do saque indevido); e
(b) CONDENAR o réu a pagar ao autor reparação civil por danos morais no montante de R$ 3.000,00 (três mil reais), com correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a partir da presente data (momento em que o valor foi arbitrado – Súmula n. 362 do STJ) e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, estes contados desde a data do início dos eventos danosos (11.8.2010, por ser a data em que o autor constatou o desfalque o procurou o réu para corrigir a situação – Súmula n. 54 do STJ).
Sem condenação em custas ou honorários nesta instância (arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95)
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Pariquera-Açu, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

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