7 de novembro de 2012

Da Falta de Empatia

(Publicação original: http://judexquovadis.blogspot.com.br/)


Especula-se muito qual o problema do nosso Judiciário. O que o entrava?

Seriam leis ultrapassadas? Ou talvez feitas por quem não trabalha diretamente com o Judiciário e os processos?

Ou seria a falta de estrutura? Material e humana?

Ou talvez a demora nas decisões decorrente disso tudo?

Acredito que o problema maior é outro.

Acredito que o problema maior é a falta de empatia.

Sim.

Falta de empatia.

Falta de conseguir se colocar no lugar do outro.

O Judiciário é um mini mundo com pessoas que seguem guerreando quando deveriam colaborar umas com as outras.

As pessoas o buscam fragilizadas, para que o juiz diga, no seu caso, no caso concreto, qual a regra aplicável, no popular, quem tem razão.

Mas na maioria das vezes, os sentimentos envolvidos tomam tal proporção, que todos perdem a razão!

Tanto as pessoas que buscam fazer valer seus direitos quanto aqueles que as representam, seus advogados, que vivem de ouvir os problemas  das pessoas, leva-los a esse julgador e tentar provar que seu cliente tem razão.

O cliente leva o problema ao advogado e espera, enquanto este tem que trazer a solução. O mais rápido possível, porque a vida pára enquanto se aguarda o julgamento. O advogado tem toda a pressa do mundo em ver solucionado aquele caso para poder receber e se dedicar ao problema de outro cliente.

O advogado vive de problemas, buscando soluções rápidas.

Entre o juiz e o advogado, ficam os funcionários do Judiciário, que vivem de administrar o inadministrável. De pegar o volume invencível de processos e tentar dar conta de todos os atos que cada processo exige.

Uma simples petição envolve uma primeira leitura para triagem, pesquisa para localizar o processo ao qual ela se refere em meio a milhares, a juntada da mesma aos autos, sua leitura mais detida, o andamento correto: o envio ao juiz para decisão, alguma determinação para alguma das partes (ato ordinatório), alguma digitação (ofício, guia, mandado), a publicação deste ato no Diário Oficial...

Se fosse apenas um o processo já seria trabalho suficiente para completar o dia da maioria dos funcionários de um cartório. Imagine em um cartório com 7.000 processos, mais de uma petição por vezes por dia, com 10 a 15 funcionários e um juiz para fazer isso tudo?

Agora imagina um funcionário em meio a esse mar de processos, com metas para atingir, um juiz, uma corregedoria e um CNJ para atender, advogados nervosos e partes tensas querendo prioridade no balcão, depois de um dia de trabalho com papel, leitura, computação, lidando em meio a esse trabalho estressante com pessoas, em seu ambiente de trabalho, dizendo que funcionário público é tudo preguiçoso, que ganha para não fazer nada?

Imagina esse funcionário, já cansado, chegando à faculdade de Direito para ouvir de um professor, advogado, que qualquer macaco junta petições mais rápido que os funcionários do fórum...

Por certo esse advogado deve ter suas razões para esse desabafo de ética no mínimo questionável em se tratando de professor universitário, talvez revoltado com a demora no andamento de algum processo.

Mas ele esquece que o escrevente não ganha nada com essa demora. Pelo contrário! Ele também tem todo o interesse em terminar aquele trabalho, se livrar do processo e da pressão.

Não percebe o advogado quantos estão envolvidos em uma juntada e que seu constante peticionamento só faz aumentar o tempo que o processo vai demorar para chegar até o juiz.

Já o funcionário, por outro lado, não percebe que o advogado depende daquele processo para obter seu ganha pão, para manter seus clientes e principalmente para ter um pouco de paz sem as constantes insinuações do cliente de que ele não faz nada em seu processo.

A parte não entende como o advogado não consegue uma decisão e como pode não haver funcionários suficientes para tocar todos os processos, como pode um juiz demorar tanto para decidir. Para a parte só há o seu processo.

E para o juiz deveria ser assim também. Cada processo deveria ser o único. Mas por vezes ele é apenas mais um a aumentar a montanha de trabalho que parece prestes a engolí-lo.

O juiz dá uma decisão e chegam mais três no momento seguinte. Sentencia um processo e o cartório manda outros cinco esperando o julgamento.

O trabalho é constante e infindável. Nunca acabará. Exige paciência. Exige calma. Exige atenção aos detalhes do que é trazido por cada parte.

Exige alguém disposto a ouvir. Como saber quem tem razão e qual o direito a ser aplicado sem gastar tempo com cada prova trazida?

Ao mesmo tempo, o trabalho pressiona para que a decisão seja rápida, para que ela seja dada antes do outro processo chegar.

E aquele juiz que imaginava ter nascido para ouvir as pessoas e decidir quem tem razão, passa a não ter tempo para ouvir. A não ter tempo para atender advogado. Não ter tempo para almoçar ou socializar.

O advogado vira o inimigo, sempre à espreita para tentar tomar o pouco tempo que lhe resta.

O funcionário vira outro inimigo, aumentando as pilhas e querendo respostas e gerenciamento. Exige tempo! Tempo que não se tem.

A parte, então, o maior dos inimigos, quer atenção, quer  falar, quer ser vista, que todo o tempo para o seu processo! Como dar o tempo que não se tem?

E cada vez mais, cada um dos personagens vai se fechando no seu mundinho, na sua realidade, suas necessidades.

E pessoas que deveriam agir em conjunto, como uma equipe, se tornam adversários, jogam em campos opostos quando estão no mesmo time. Como um time de futebol onde cada jogador quer ter sua própria bola e faz seu próprio jogo, tumultuando o meio de campo, mas ainda assim esperando fazer gol!

Como John Lenon, eu tive um sonho, todos no Poder Judiciário trabalhando juntos, com colaboração, gentileza, urbanidade, com o objetivo de resolver o problema que levou as partes até ali,  tendo como resultado conflitos solucionados, pessoas felizes e trabalhos bem feitos e finalizados.

Aquela sensação de terminar o dia com o dever cumprido para funcionários, juízes, promotores, delegados e advogados. A certeza do problema resolvido e da página virada, para as partes.

Carolina Nabarro Munhoz Rossi

Um comentário:

  1. Não entendo nada do judiciário, mas os pequenos problemas que tive, percebi que se acabasse um pouco a burocracia, e as partes fossem ouvidas informalmente, sem aqueles ritos, onde vc não pode falar e portanto não será ouvido, 80% dos processos seriam finalizados rapidamente, evitando tanto trabalho, a advogados, cartorários e juizes...

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