2 de fevereiro de 2012

Respeito aos animais


Vistos.


Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO em face de XXXX.

Apurou-se no inquérito civil anexado que o estabelecimento veterinário requerido, também conhecido como “XXXXX”, desenvolve atividades de captura, transporte, alimentação, alojamento, tratamento emergencial, castração e eutanásia em animais de pequeno, médio e grande porte para a Prefeitura Municipal de Itapevi. Em vistoria realizada no local, constatou-se que existem irregularidades graves nas suas instalações e funcionamento, evidenciadas também pela falta de alvarás do Corpo de Bombeiros, da Prefeitura e da Vigilância Sanitária Municipal, além de utilização de telhas incorretas para a cobertura dos canis.

Diante disso, após discorrer sobre as normas que disciplinam a matéria, requereu o Ministério Público a condenação da requerida em obrigação de fazer, consistente na total regularização de seu estabelecimento e conseqüente obtenção das autorizações da Prefeitura Municipal, da Vigilância Sanitária Municipal e do Corpo de Bombeiros, proibindo-a de receber novos animais até a implantação de tais medidas, além de obrigá-la a promover, no prazo de 60 dias, às suas expensas, a remoção e a manutenção dos animais em estabelecimento veterinário adequado até a completa regularização do local, tudo sob pena de multa diária.

Para tanto, pleiteia, em antecipação de tutela, que novos animais sejam impedidos de ingressar no estabelecimento requerido e que no prazo de 60 dias os animais que já estão no seu interior sejam transferidos para outro local que esteja regular.

A liminar deve ser deferida em termos.


Há verossimilhança nas alegações do autor, representada pela vistoria realizada pelo Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal (fls. 364), pelas denúncias de maus tratos a animais (fls. 38/39 e fls. 341/342 e 536/563, esta última feita pela União Internacional Protetora dos Animais), pelos depoimentos de fls. 47 e 178, pela representação feita pelo CEBEA (fls. 208/214), pelo ofício que atesta a ausência de alvará do Corpo de Bombeiros (fls. 822) e pela vistoria realizada no último dia 15 pelo Ministério Público e pela Vigilância Sanitária Estadual a Municipal, havendo, ainda, além da notícia de que o gatil ainda permanece interditado pela Vigilância Sanitária Municipal e que não há sequer projeto de reforma, relatório atestando a existência de “deterioração intensa ao meio ambiente” no local (fls. 683), sendo possível vislumbrar, ao menos neste juízo sumário de cognição, além de ofensa ao contrato administrativo celebrado com o Município de Itapevi, manifesta violação ao art. 225, § 1º, VII, da Constituição Federal, ao art. 193, X, da Constituição Estadual, ao art. 2º, I e II da Lei Estadual nº 11.977/05, ao art. 135, V, da Lei Orgânica do Município de Itapevi e ao art. 2º, I, II e V da Lei Municipal de Proteção aos Animais nº 1.961/09.

O periculum in mora, no presente caso, é evidente, eis que a perpetuação dos danos e demais irregularidades, em razão da inércia da requerida, que já decorre de vários anos, inobstante os esforços empregados pelo autor da ação e por várias outras entidades para que a situação se regularizasse, já gerou, está gerando e continuará a gerar, dia após dia, prejuízos irreversíveis a inúmeros animais e ao próprio meio ambiente.

Por tais razões, deve ser deferida medida de urgência visando evitar o agravamento da situação existente no local.

A tutela antecipada, no entanto, nos termos em que pleiteada, geraria dificuldades práticas de implementação, pois a requerida, se ainda não logrou regularizar seu próprio estabelecimento, certamente encontrará empecilhos concretos para transferir todos os animais para outro local que esteja devidamente regularizado. O requerimento de que novos animais sejam impedidos de ingressar no estabelecimento requerido até a sua total regularização, ao menos em meu entender, também não teria o condão de evitar o agravamento da situação, pois inexiste qualquer notícia de superlotação, restando constatado, na última vistoria, que o canil contava com cerca de 30 a 35 cães e que tinha capacidade para abrigar de 45 e 50 animais. Ademais, a proibição do ingresso de novos animais certamente geraria novos inadimplementos contratuais, eis que, além da avença celebrada com o Município de Itapevi, a requerida também possui contrato semelhante com o Município de Santana de Parnaíba.

A melhor solução será a concessão de tutela antecipada que obrigue a requerida a regularizar completamente o seu estabelecimento, com a conseqüente obtenção das autorizações da Prefeitura Municipal, da Vigilância Sanitária Municipal e do Corpo de Bombeiros, abrangendo a regularização do gatil e das telhas para a cobertura dos canis, no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais) após o término do referido prazo.

Referida medida, embora diversa da pleiteada pelo autor da ação em caráter liminar, pode ser concedida não apenas por constituir medida menos gravosa para a requerida, mas também diante da regra prevista no § 7º do art. 273 do Código de Processo Civil, eis que doutrina e jurisprudência dominantes entendem que referido dispositivo estabeleceu verdadeira “regra de mão dupla”.

O prazo de 60 (sessenta) dias é suficiente para que as medidas sejam implementadas, evitando-se o agravamento dos danos e garantindo a eventual eficácia da futura sentença a ser proferida nesta ação. Ressalto que a requerida está ciente e inerte a respeito dos fatos descritos na inicial há vários anos, não podendo agora alegar que tal prazo é pequeno, tendo em vista o princípio turpitudinem suam alllegans non auditur. Consigno, além disso, que um prazo bem menor já foi suficiente para que providências semelhantes fossem realizadas em caso análogo decidido nos mesmos moldes por este magistrado (Ação Civil Pública nº 339/11, que tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Jacupiranga).

O valor da multa também se mostra razoável diante das peculiaridades do caso concreto, especialmente pelo fato de que, além da avença celebrada com o Município de Santana de Parnaíba, a requerida também possui contrato com o Município de Itapevi no valor de R$ 396.000,00 (fls. 1308/1320)

Ante o exposto, com fundamento no art. 12 da Lei 7.347/85 e no § 7º do art. 273 do Código de Processo Civil, CONCEDO EM TERMOS A TUTELA ANTECIPADA para determinar que a requerida, no prazo de 60 (sessenta) dias, providencie a completa regularização do seu estabelecimento, com a conseqüente obtenção das autorizações da Prefeitura Municipal, da Vigilância Sanitária Municipal e do Corpo de Bombeiros, incluindo a regularização do gatil e das telhas para a cobertura dos canis, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais), contada a partir do término do aludido prazo.

Notifique-se o Município de Itapevi para que, querendo, intervenha no feito.

No prazo de 60 (sessenta) dias, deverá o Sr. Oficial de Justiça verificar o cumprimento da liminar, constatando a situação do estabelecimento veterinário requerido e a existência das mencionadas autorizações, juntando descrição minuciosa aos autos.

Cite-se.

Ciência ao Ministério Público.

Int.

Itapevi, 13 de janeiro de 2012.

DIEGO BOCUHY BONILHA
            Juiz de Direito

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