20 de dezembro de 2011

Falso testemunho sem potencialidade lesiva


Vara Judicial da Comarca de Juquiá
Autos nº 209/2008
Autor:                      Ministério Público do Estado de São Paulo
Denunciado:            XXXX

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos, etc.
1. Relatório:
XXXX foi denunciado em razão de falso testemunho com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal que teria ocorrido em 25 de fevereiro de 2008 (fls. 1-3).
O recebimento da denúncia ocorreu em 8 de janeiro de 2010 (fl. 102) e, depois da apresentação de resposta (fls. 119-122), restou confirmado (fl. 132).
Durante a instrução houve a inquirição de três testemunhas (fls. 154, 156 e 187) e o interrogatório (fls. 188-189).
Em alegações finais a acusação pugnou pela condenação, sustentando estar provada a incursão do réu no crime (fls. 193-197). A defesa apresentou pedido de absolvição sob os argumentos de que o réu não mentiu, não agiu com dolo e de que o fato não teve capacidade de influir na decisão (fls. 201-206).
É o relatório. Decido.
2. Fundamentação:
É certo que o réu faltou com a verdade em juízo quando foi inquirido como testemunha, pois foi taxativo ao dizer que o seu encontro com M (réu nos autos originais) se deu no dia 27 de outubro de 2006 por volta das 6h30min (fl. 49). Isso porque o exame entre os tempos existentes entre os outros furtadores terem voltado para resgatar o veículo abandonado (fls. 154 e 156), entre N haver conduzido M de Miracatu até o centro de Juquiá (fl. 187) e entre o encontro de M com XXXX na entrada do bairro Tangará demonstra ser impossível que esse encontro tenha ocorrido por volta das 6h30min do dia 27 de outubro de 2006.
Aliás, tornando inequívoca a divergência com a realidade o próprio réu XXXX ao ser interrogado em juízo confirmou que não podia ter apontado a exata data de 27 de outubro de 2006, pois sabia apenas que esse encontro havia ocorrido em um final de mês (fls. 188-189).
Todavia, o caso demanda solução absolutória.
Isso porque “não obstante se cuide de um crime formal, a objetividade jurídica do tipo – erigido no interesse da administração da Justiça – como é de regra nos crimes de falso, reclama a potencialidade lesiva da declaração inverídica, isto é, ‘que possa influir sobre o resultado do julgamento’ (Fragoso, ‘Lições de Dir. Penal, 1965, 4/1221)” (STF, HC 69047/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.4.1992, p. 05377).
E, efetivamente, na situação dos autos a declaração inverídica não tinha o condão de influir no resultado do julgamento, pois não era hábil a conferir álibi para M, na medida em que o horário do furto praticado por M foi entre a 1h30 e as 2h da madrugada (fls. 154 e 156). Aliás, nesse aspecto, as próprias alegações finais da acusação naquele processo-crime originário anotaram que “de mais a mais, não se pode deixar de observar que ainda que tal fosse verdade, ainda assim o réu não estaria livre da acusação, já que os fatos articulados na denúncia ocorreram durante a madrugada, bem antes da suposta ‘tentativa de homicídio’ ou encontro com a famigerada testemunha de defesa. Nada impede, assim, que após ser surpreendido pela vítima e fugido do local, tenha se dirigido a Juquiá, onde tais alegados acontecimentos teriam ocorrido” (fls. 169-170). Tanto assim o é que a sentença sequer mencionou aquele testemunho de XXXX (fls. 177-185).
Portanto, como a declaração inverídica não tinha como influir (como de fato não influiu) sobre o resultado do julgamento, falece sua potencialidade lesiva, tornando necessária a absolvição nos moldes do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.
3. Dispositivo:
Diante do exposto, e com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal, julgo improcedente a pretensão punitiva consubstanciada na denúncia, para o fim de ABSOLVER o acusado XXXX.
Sem custas, em razão da absolvição.
Em observância ao item 22, “d”, do Capítulo V das Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo, e com a qualificação completa do sentenciado, comunique-se o desfecho da ação penal ao serviço distribuidor e ao Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt.
Após tudo cumprido, arquive-se o feito.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.
De Jacupiranga para Juquiá, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

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