29 de agosto de 2011

Previdenciário: aposentadoria especial








1ª Vara Judicial da Comarca de Jacupiranga
Autos nº 110/2008
Autor:                       XXXX
Réu:                          Instituto Nacional do Seguro Social - INSS

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos, etc.
1. Relatório:
XXXX ajuizou contra o Instituto Nacional do Seguro Social pretensão de obtenção de benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição em razão de haver laborado em condições especiais (fls. 2-7).
O INSS apresentou contestação na qual contrariou o mérito sob os argumentos de ausência de prova acerca da efetiva, habitual e permanente exposição a agentes nocivos, além da inviabilidade de conversão do tempo especial em comum em alguns dos períodos (fls. 60-69).
Houve réplica (fls. 128-129).
O processo foi saneado (fls. 139-140).
Em instrução houve a realização de perícia (fls. 199-207). As partes tiveram oportunidade de se manifestar acerca do laudo (fls. 217-218 e 219) e em sede alegações finais (fl. 234).
O réu recusou a propositura de acordo (fl. 237).
É o relatório. Decido.

2. Fundamentação:
O autor tem direito à aposentadoria especial.
Apesar de tal benefício não ser o ventilado expressamente na petição inicial, é o que decorre da conformação jurídica dos fatos colocados à apreciação jurisdicional. Tem lugar, portanto, a aplicação da teoria da substanciação da causa de pedir (naha mihi factum dabo tibi ius). Em caso análogo já se posicionou nesse sentido (da possibilidade de concessão de benefício diverso do postulado) o Superior Tribunal de Justiça: REsp 847587, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJE, 1.12.2008.
Efetivamente o autor fazia jus à aposentadoria especial já ao tempo do requerimento administrativo (8.1.2007 – fl. 10), pois trabalhou em condições especiais ao longo de toda a sua vida laboral, ou seja, desde 1.12.1969 (fls. 43-44 e 47-51), de modo que até 19.5.2006 já contava com 29 anos, 9 meses e 3 dias de trabalho em condições especiais.
A esse respeito há de se ver que a própria natureza das funções (serviços nas áreas de mineração entre 1.12.1969 e 19.2.1972, de engenharia de 17.5.1972 a 15.7.1972, de química de 14.10.1977 a 1.10.1991, de operação de máquinas pesadas de 2.3.1996 a 30.4.1998 e de operação de máquina de transporte de minério a céu aberto de 3.5.2000 a 19.5.2006) e o trabalho contínuo nelas (com períodos de trabalho similar na cronologia) demonstram que o autor exerceu efetivamente tais atividades ao longo de toda a sua vida, tendo ficado sujeito a agentes nocivos e fazendo jus à aposentadoria especial. Aliás, no período até 28.4.95 o trabalho era considerado especial até mesmo de modo presumido, porquanto estivesse previsto pelo Decreto n. 83.080/79 (artigo 60 e código 1.1.2 do seu Anexo I). Já quanto ao período subsequente o perfil profissiográfico previdenciário (fls. 19-20 e 21-23), as informações sobre atividades exercidas em condições especiais (fls. 15 e 24) e os laudos técnicos de condições ambientais de trabalho (fls. 6-18, 25-26, 170-175, 176-180, 181-184 e 185-186) são suficientes a comprovar a natureza especial de todos os trabalhos desempenhados, pois não há quaisquer elementos de fato apresentados que possam elidir a idoneidade de tais documentos. Ademais, espancando qualquer dúvida se tem a clara e firme conclusão do laudo pericial (fls. 199-207) a atestar que todos os trabalhos foram desempenhados em condições especiais. Esse conjunto de elementos só permite uma conclusão: a aposentadoria especial é devida.
Aliás, o exame atento dos autos demonstra que a única circunstância pela qual a aposentadoria especial não foi concedida administrativamente foi a (errônea) conclusão de que o uso de equipamentos de proteção impediria os efeitos dos agentes nocivos (fl. 39). Todavia, o uso de equipamentos de proteção (ainda que hábeis a reduzir a nocividade) não tem o condão de desnaturar o caráter nocivo dos agentes e nem a natureza especial do trabalho. A referência da legislação aos equipamentos de proteção, apesar de estar incluída na subseção da aposentadoria especial (art. 58, § 2º, da Lei n. 8.213/91), refere-se apenas à necessidade de que ela seja objeto de menção no laudo técnico realizado acerca dos agentes nocivos como forma de facilitar a fiscalização quanto ao atendimento pelas empresas das regras que norteiam a relação de trabalho, tanto que o não atendimento pela empresa de tais requisitos a sujeita a penalidade (art. 58, § 2º, da Lei n. 8.213/91). E nem poderia ser diferente, pois o objetivo dos equipamentos de proteção é o de tentar preservar a saúde do trabalhador, evitando o precoce acometimento de moléstias ou de acidentes do trabalho. De todo modo, é assente o entendimento de que “a disponibilidade ou utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) não afasta a natureza especial da atividade, porquanto as medidas de segurança não eliminam a nocividade dos agentes agressivos à saúde, tendo apenas o condão de reduzir os seus efeitos” (TRF3, Processo 2010.03.99.028552-5, rel. Leide Polo, j. 6.6.2011).
Assim, é cristalino que o autor reúne os requisitos a alcançar a aposentadoria especial, fazendo ruir e tornando inócua a alegação defensiva de inviabilidade de conversão do tempo especial em comum em alguns dos períodos, porquanto se trate de tempo de serviço para cômputo de aposentadoria integralmente trabalhado em condições especiais.
A data de início do benefício deve ser a partir do requerimento administrativo (8.1.2007). Não deve ser fixada como termo inicial a data da perícia judicial, eis que na espécie o INSS teve ampla oportunidade de apreciar administrativamente a farta documentação técnica, tendo indeferido o benefício por interpretação que destoa do entendimento jurisdicional dominante (fl. 39). Assim, não pode o INSS ser beneficiado pela sua própria falha, sob pena de violação ao corolário da boa-fé objetiva que deve nortear todas as relações interpessoais. Obviamente, deverão ser objeto de abatimento do montante da condenação quanto aos atrasados eventuais valores já pagos no período coincidente a título de eventual benefício diverso.  
3. Dispositivo:
Diante do exposto, e extinguindo o feito com resolução de mérito (artigo 269, inciso I, do CPC), JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial para os efeitos de:
(a) impor ao réu a obrigação de conceder aposentadoria especial ao autor, a ser devida a partir do dia 8 de janeiro de 2007 (data do requerimento administrativo, consoante fl. 10); e
(b) condenar o réu ao pagamento de todas as prestações vencidas e vincendas desde a data de início do benefício (8.1.2007) até a da efetiva implantação (com abatimento de eventuais valores já pagos no período coincidente a título de eventual benefício diverso), com acréscimo de juros de mora e de correção monetária, ambos calculados pelos índices oficiais de remuneração básica e de juros aplicados à caderneta de poupança, incidentes de uma única vez, até o efetivo pagamento (art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/09).
Tendo em vista que o valor dado à causa é inferior a sessenta salários mínimos, o caso se enquadra na previsão do art. 109, § 3º, da Constituição da República Federativa do Brasil, combinado com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001, c/c o art. 55 da Lei nº 9.099/95, razão pela qual não há condenação em custas ou honorários nesta instância.
Concedo a tutela liminar da prestação específica. É relevante o fundamento da demanda, pois os documentos e perícia encartados ao feito demonstram o direito do autor em obter a aposentadoria especial, tanto que já recebeu provimento meritório a esse respeito em primeiro grau de jurisdição. Existe justificado receio de ineficácia do provimento final, o que além de ser intrínseco à modalidade da pretensão, decorre da condição de pobreza do autor (fl. 9). O requisito da reversibilidade da medida é mitigado pelo prestígio que deve ser conferido à dignidade da pessoa humana. Destarte, com esteio no artigo 461, § 3º, do Código de Processo Civil, concedo medida liminar para o efeito de determinar provisoriamente a implantação do benefício de aposentadoria especial em favor do autor XXXX.
Oficie-se com urgência à EAVDJ Santos (Equipe de Atendimento a Decisões Judiciais) para que providencie o cumprimento à medida liminar (com implantação do benefício de aposentadoria especial) no prazo de 30 dias. Instrua-se o ofício com cópia da presente decisão e informe-se o nome completo do beneficiado, a data de nascimento, o endereço, o número do RG e do CPF.
Sentença não sujeita a reexame necessário por versar condenação ilíquida e o valor atualizado da causa não suplantar o montante exigido para o recurso de ofício (artigo 475, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil).
Ciência ao Ministério Público do Estado de São Paulo. 
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. 
Jacupiranga, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

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