10 de agosto de 2011

Reprovabilidade intensa


Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Réu(s): F
Processo: 664.01.1996.006074-6/000000-000
Número de ordem: 12.001.2011/000015
Tipo penal: Art. 121, § 2º, incisos II e IV, do Decreto-Lei 2.848/41 - Código Penal
  
                       Capítulo I – Do relatório.
                       F, qualificado nos autos, submeteu-se a julgamento em plenário, nesta data, acusado de praticar crime doloso contra a vida. Consta da acusação que o réu, no dia 23 de julho de 1996, por volta de 20:00 horas, na rua XXXX agindo com a intenção de matar, por motivo fútil e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, teria espancado a jovem XXXX, de dezoito (18) anos de idade, causando-lhe múltiplas lesões corporais que ocasionaram sua morte, conforme laudos de fls. 17 e 25.
                       O processo foi devidamente instruído, houve regular oitiva das testemunhas arroladas, além de interrogado do réu. As partes apresentaram suas razões finais e o réu foi pronunciado (fls. 207ss) nos termos da acusação. A decisão de pronúncia transitou em julgado em 09 de junho deste ano (fls. 248), pois o réu abriu mão de recorrer (fls. 245).

                       Capítulo II – Da motivação e dosimetria.
                       Submetido a julgamento nesta data perante este Tribunal do Júri, o ilustre Conselho de Sentença decidiu que o réu F praticou o delito de homicídio qualificado por motivo fútil e pelo recurso que dificultou a defesa da vítima, CONDENANDO-O, assim, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal. Respeitada a decisão soberana dos jurados, procedo à individualização da pena, considerando inicialmente cada uma das oito circunstâncias do art. 59 do Código Penal:
        1. Primeira circunstância: a culpabilidade, entendida como grau de censura contida na ordem jurídica para reprovação da conduta do réu deve ser considerada muito acima do normal, pois a vítima morreu em razão de espancamento com instrumento contundente (fls. 17), quais sejam, socos, causando-lhe na região frontal lesões corto-contusas com fratura e afundamento. Além disso, sofreu lesões corto-contusas nas duas pálpebras e no lábio superior. A vítima perdeu ainda 3 (três) dentes incisivos superiores. Como se não bastasse, sofreu fraturas dos maxilares superiores e na asa esquerda do esfenoide, que é um osso da base do crânio. Enfim, a vítima não sofreu a morte repentina por um tiro na cabeça, ou uma facada em órgão vital. Não. Sofreu inestimável dor prolongada com inúmeras pancadas por instrumento contundente, quais sejam, socos, vindo a falecer dias após, em 5 de agosto do mesmo ano.
        2. Segunda circunstância: o acusado não tem maus antecedentes.
        3. Terceira: não há elementos que demonstrem conduta social desfavorável anteriormente ao crime.
        4. Quarta: não há elementos desfavoráveis à personalidade do réu antes do crime.
        5. Quinta: o motivo foi fútil, pois baseado na recusa da vítima em continuar o namoro. Fato admitido pelo réu em seu interrogatório nesta sessão. Entretanto, essa circunstância não será isoladamente considerada para agravar a pena do réu, pois inerente à qualificadora do inc. II, do § 2º do art. 121 do Código Penal.
        6. Sexta: as circunstâncias concretas do crime são desfavoráveis, pois as agressões ocorreram com a vítima já no chão, fato também admitido pelo réu no interrogatório, as quais impediram por parte dela qualquer reação e defesa. Entretanto, esse fator não será isoladamente considerado para agravar a pena do réu, pois inerente à qualificadora do inc. IV, do § 2º, do art. 121 do Código Penal.
        7. Sétima: não há conseqüências desfavoráveis além da morte da vítima, que é própria do crime.
        8. Oitava: não há rastros de que o comportamento da vítima tenha influenciado a conduta do réu.
                       Considerando que todas as 8 (oito) circunstâncias judiciais possuem o mesmo valor, bem como apenas duas destas oito são desfavoráveis, quais sejam, a culpabilidade e a dupla qualificação considerada em conjunto, a pena base deve se resumir no montante de 2/8 (dois oitavos) do intervalo entre a pena mínima e a máxima do delito, somado à pena mínima. Como o intervalo entre a pena mínima (de 12 anos) e a máxima (de 30 anos) do homicídio qualificado é de 18 (dezoito anos), e 2/8 (dois oitavos) de 18 (dezoito) anos são 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses, doso a pena-base em 16 (dezesseis) anos e 6 (seis) meses de reclusão.
                       Não há  atenuantes, muito menos confissão, pois o réu negou a intenção de matar a vítima. Também inexistem agravantes, causas de aumento ou de diminuição. O réu não tem direito aos benefícios da Lei 9.099/95, e muito menos à substituição de sua pena ou sua suspensão condicional, razão pela qual torno definitiva a pena em 16 (dezesseis) anos e 6 (seis) meses de reclusão.
                       Como a pena é superior a 8 (oito) anos, seu cumprimento se iniciará no regime fechado (artigo 33, § 2º, “a”, do Código Penal). O acusado não poderá recorrer em liberdade, pois foragido durante mais de uma década, sendo sua prisão indispensável para se garantir a aplicação da lei penal. Deixo de fixar indenização mínima, tal qual consta no art. 387, inc. IV, do CPP, por não ser objeto de instrução ou pedido.

                       Capítulo IV – Do dispositivo.
                       Diante do exposto, julgo procedente a pretensão punitiva, motivo pelo qual DECLARO o acusado F CULPADO e o CONDENO como incurso no art. 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, à pena de 16 (dezesseis) anos e 6 (seis) meses de reclusão, cujo cumprimento se iniciará em regime fechado. Como já dito e fundamentado, o acusado não poderá recorrer em liberdade. Expeça-se mandado de prisão, recomendando-se continue preso no lugar em que se encontra.
                       Transitada em julgado, tome o cartório as seguintes providências: 1) Comunique-se ao Juízo Eleitoral para as providências cabíveis, tal qual consta do art. 15, inc. III, da Constituição Federal; 2) Lance-se o nome do acusado no rol dos culpados, fazendo-se as anotações de estilo, nos termos do art. 393, inc. II, do Código de Processo Penal, c/c art. 5º, LVII, da Constituição Federal; 3) Extraiam-se a guia de execução definitiva e encaminhem-se-a ao Juízo da Execução, conforme art. 105 da Lei de Execução Penal.
                       Sentença publicada neste ato. Os presentes saem intimados. Registre-se oportunamente e cumpra-se.
                       Sala Especial do Tribunal do Júri
              Votuporanga, 16 horas e 15 minutos de 5 de agosto de 2011.

                       RENATO SOARES DE MELO FILHO
                                  Juiz Presidente

Um comentário:

  1. Eu fico indignada e revoltada com estas histórias de violência "passional", seja entre namorados ou casais.

    Mas o que me deixa também indignada é o fato de, no caso de violência doméstica, a mulher ser agredida fisicamente (geralmente as agressões não são poucas), e não querer fazer a representação.

    Aliás, outra indignação minha é essa questão da necessidade de representação no caso da Lei Maria da Penha...faz-se de tudo para a "coisa" não funcionar!

    E aí, em uma madrugada qualquer, o Delegado de Polícia, tendo a sua frente uma vítima de violência doméstica (que está com a cabeça deformada pelas agressões), pede se a mesma quer realmente que seja lavrado o flagrante ou prefere a imposição de uma medida protetiva, a vítima, sem entender nada, e ante a insistência do Delegado, opta pela medida protetiva. Dá para acreditar?...Tantas medidas protetivas, pena que na prática não resolvem nada, e a mulher continua em risco, ainda maior...

    Taís.

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