10 de agosto de 2012

Falha de diagnóstico, mas sem erro crasso


2ª Vara Judicial da Comarca de Espírito Santo do Pinhal
Autos nº 879/2011
Autor:         J
Réus:          Município de Santo Antonio do Jardim e
                   Estado de São Paulo

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos.
1. Relatório:
J com a demanda pretende a realização de cirurgia e reparação civil por dano moral em razão de falha em diagnóstico médico (fls. 2-18).
Os réus apresentaram defesas (fls. 79-88 e 121-130). Houve chamamento ao processo, fizeram alegação de ausência de responsabilidade e de realização de atendimento adequado, bem como contrariam os danos morais.
Houve réplica (fls. 135-137).
É o relatório. Decido.

2. Relatório:
Os elementos de convicção carreados aos autos são suficientes para a formação da convicção jurisdicional. Mesmo que se assumissem como verdadeiras todas as assertivas de fato lançadas pelas partes, o desfecho seria o mesmo.
Indefiro o chamamento ao processo, pois não é viável no caso tal modalidade de intervenção e, ainda, nenhum resultado prático haveria em se trazer outras partes ao processo.
Não houve erro médico passível de indenização. O autor passou por pelo menos quatro profissionais médicos, em três instituições diferentes, e nenhum conseguiu constatar a moléstia que foi verificada pelo exame que ensejou a conclusão de fl. 44 (de presença de hemorroidas de grosso calibre). Ou seja, está claro que a eventual falha de diagnóstico não decorreu de efetivo erro médico, mas de mera incapacidade dos profissionais diante da realidade da Medicina de conseguir diagnosticar a moléstia, incapacidade essa que não constitui erro crasso, pois do contrário não haveria quatro médicos a não conseguir tal diagnóstico. E vale lembrar que médicos não são deuses capazes de diagnosticar, tratar e curar todas as moléstias de todas as pessoas.
E como não houve ilícito civil, falta um dos elementos a que surja o dever de indenizar, razão pela qual são improcedentes os pedidos de danos materiais e morais.
Mas é o caso de ser realizada a cirurgia.
Houve o diagnóstico da moléstia (fl. 44) e deve ela ser tratada, pois os réus têm o dever solidário de zelar pela saúde. É que os artigos 6º e 196 a 200 da Constituição da República Federativa do Brasil asseguram a todos o acesso universal à saúde. E embora muitas pessoas se esqueçam, a própria Constituição prevê que todas as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (artigo 5º, § 1º). Nesse sentido: TJSP, Apelação n. 0040604-37.2009.8.26.0309, relator Osvaldo de Oliveira, julgado em 6.6.2012.
3. Dispositivo:
Diante do exposto, e extinguindo o processo com resolução de mérito, julgo parcialmente procedente a pretensão inicial, para os fins de:
(a) rejeitar o pedido de reparação civil por danos materiais e morais; e
(b) impor aos réus solidariamente a obrigação de fazer consistente em providenciar e viabilizar a execução da cirurgia para remoção da moléstia diagnosticada no documento de fl. 44.
Concedo a tutela liminar da prestação específica. É relevante o fundamento da demanda, pois os documentos encartados ao feito demonstram o direito do autor em obter a realização da cirurgia, tanto que já recebeu provimento meritório a esse respeito em primeiro grau de jurisdição. Existe justificado receio de ineficácia do provimento final, o que é intrínseco à modalidade da pretensão, pois cada dia que passa é um dia a mais sofrendo com a moléstia. O requisito da reversibilidade da medida é mitigado pelo prestígio que deve ser conferido à dignidade da pessoa humana. Destarte, com esteio no artigo 461, § 3º, do Código de Processo Civil, concedo medida liminar para o efeito de determinar aos réus que no prazo de trinta dias (contados da intimação da presente decisão) solidariamente providenciem e viabilizem a execução da cirurgia para remoção da moléstia diagnosticada no documento de fl. 44, sob pena de multa (punitiva e compensatória) no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a incidir de uma única vez.
Considero que as partes foram sucumbentes em extensões equivalentes. Assim, tenho por presente a sucumbência recíproca, de modo que ficam compensados os honorários advocatícios, nos moldes do artigo 21, caput, do CPC e do disposto na Súmula n. 306 do Superior Tribunal de Justiça.
Ciência ao Ministério Público.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.                 
Espírito Santo do Pinhal, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

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