4 de agosto de 2012

O verão foi embora e o ar-condicionado não chegou



Juizado Especial Cível da Comarca de Espírito Santo do Pinhal
Autos nº 290/2012
Autor:                       A
Ré:                            B

S  E  N  T  E  N  Ç  A

Vistos.
1. Relatório dispensado. Decido.
2. É caso de pronto julgamento, não havendo necessidade de provas orais.
O autor comprou um ar-condicionado para utilizar durante o verão e não recebeu o produto adquirido. A parte ré para ele enviou produtos com especificações diversas da comprada, os quais foram corretamente devolvidos pelo consumidor. Até hoje o autor não recebeu o produto adequado, mesmo tendo se valido da via administrativa, do PROCON e do Poder Judiciário.
A ré em sua defesa não negou sua conduta indevida. Pelo contrário, confirmou que não possui o produto que foi adquirido e se limitou a contrariar os danos morais ao argumento de ser um mero dissabor.
Como a parte ré não entregou e não possui o produto adquirido, resta inviável a obrigação de fazer, devendo a situação se resolver pela restituição do valor cobrado (R$ 599,31), sem quaisquer ônus para o consumidor.
E estão presentes danos morais.
Primeiro, pela própria conduta abusiva da ré em expor à venda e concluir negociação de venda com relação a um produto que não detinha.

Segundo, pela efetiva frustração dos anseios do autor, eis que a considerar pela data da compra, o intuito dele era mesmo o de usufruir do ar-condicionado durante a época do verão, conforto esse que lhe foi tolhido em razão da conduta inadequada da ré.
Terceiro, porque o autor foi tratado de modo muito desidioso pela ré, que não deu pronta solução ao caso. O autor foi submetido a inúmeros procedimentos administrativos junto à ré e junto ao PROCON, não tendo sido atendido. Essa sujeição a inúmeras idas e vindas para conseguir obter um direito que claramente possui transborda o mero dissabor decorrente do desacerto negocial e se afigura hábil a aviltar a dignidade do consumidor.
Cumpre, então, mensurar o valor da indenização.
Atentando que a fixação deve ser suficiente a recompensar o lesado (sem ser irrisória e, ao mesmo tempo, sem se constituir em causa de enriquecimento indevido), bem como sopesando no caso as condições econômicas da ré (sólida empresa) e do autor, a intensidade das ofensas (que, como já visto, foram múltiplas) e a suficiência para coibir a reiteração de condutas semelhantes pela ré (merecendo realce na espécie que a documentação apresentada pelo autor demonstra que vários outros consumidores foram alvo da mesma prática indevida, conforme se extrai às fls. 24-27, o que implica em severos transtornos aos consumidores e gera inúmeras demandas judiciais, atulhando desnecessariamente o Poder Judiciário; modo de agir esse que obviamente se afigura lucrativo, pois do contrário haveria modo de agir mais diligente e atencioso para com as pessoas em geral), reputo coerente e proporcional a mensuração do valor para reparação dos danos morais na quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Esclareço, por oportuno, que embora essa quantia seja elevada se comparada a outros salários, não se trata de quantia capaz de enriquecer ninguém; nem mesmo um andarilho é capaz de se tornar rico com a quantia de dez mil reais, de modo que não se há que ter essa quantia como um enriquecimento desproporcional. Anoto, ainda, que muito embora a quantia seja superior à pedida na inicial, em sede de dano moral isso se faz possível, pois cabe ao juiz definir a quantia, sendo de se entender que as estimativas apresentadas pelas partes consistem em meras sugestões.
Por fim, muito embora a conduta da ré seja abusiva e desidiosa, não reputo necessária, por ora, a condenação em litigância de má-fé.
3. Dispositivo
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (CPC, art. 269, inciso I), para os efeitos de:
(a) CONDENAR a ré a ressarcir ao autor a quantia de R$ 599,31, com correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo desde 6.12.2011 e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês (estes contados desde a citação – 9.4.2012). E
(b) CONDENAR a ré a pagar ao autor reparação civil por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) sobre o qual incidirão juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ambos contados da presente data (momento em que o valor se tornou líquido) até o efetivo pagamento.
Sem imposição de ônus de sucumbência nesta instância.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Espírito Santo do Pinhal, autodata.

AYRTON VIDOLIN MARQUES JÚNIOR
Juiz Substituto

3 comentários:

  1. essas empresas estão sempre passando a perna na gente.
    Parabéns pela decisão.......tomara que assim eles aprendam a ter mais respeito pelo consumidor!!!

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  2. Ótima decisão. Nem muito, nem pouco, foi a condenação pelos danos morais. Atribuiu-se de forma proporcional à conduta praticada, a situação e o poder econômico (esclarecido na sentença, embora o acertado anonimato) do Autor e da Ré, respectivamente. Além de observar que esta decisão também tem efeitos pedagógicos para o infrator.
    A sociedade necessita de mais juizes assim!!!

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  3. Pinhal foi privilegiada em ter tido, ainda que de forma efêmera talvez, um juiz de mente tão aberta, muito a frente de seu tempo. Além de decisões técnicas e escorreitas, ainda cultiva poesia e reflexões axiológicas. Pela juventude, pela capacidade, pela vocação e pela inteligência, seu futuro será brilhante nos mais altos areópagos brasileiros. Parabéns! Depois de 10 anos de magistério superior, no direito, consigo ver o encantamento e a sobriedade no trato com o direito, com respeito a vida das pessoas e não apenas ao papel dos feitos. Faz lembrar VICENTE RAO.

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