3 de janeiro de 2012

Concursos públicos...




RECURSO DE APELAÇÃO

Apelante:              XXXX

Apelados:             Gerente Executivo de Recursos Humanos

                              Petróleo Brasileiro S/A - PETROBRÁS




EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

XXXX, brasileira, casada, administradora de empresas, regularmente inscrita no CRA/PR sob nº 00000 e no CPF/MF sob nº 00000, portadora da Cédula de Identidade nº 00000 SSP/PR, por intermédio de sua advogada infra firmada, Rosana Maria Vidolin Marques, portadora da OAB/PR nº 23.025, comparece respeitosamente perante suas excelências para apresentar suas razões de apelação, nos seguintes termos.

I. EXPLICAÇÃO DO CASO        
                            Excelências. O caso é de uma grande simplicidade, chegando a ser difícil acreditar que a conduta violadora do ordenamento jurídico tenha sido chancelada até o momento. A Petrobrás vulnerou tantos direitos cristalinos da apelante, que somente escondendo os preceitos que regem a administração pública e os concursos públicos é que se afigura possível tamanha injustiça. A apelante foi solenemente ignorada pela Petrobrás. Depois teve seu caso esquecido e ignorado pela Justiça Estadual durante anos. E por último teve os argumentos da impetração também olvidados pela Justiça Federal em primeiro grau (que não os examinou por completo, mesmo diante da oposição de embargos de declaração). Por todas essas condutas que ignoraram até agora a impetrante e seus direitos é que se roga a Vossas Excelências um olhar atencioso e humano para este caso.
                            Veja-se.
                            A ora apelante participou de um processo seletivo público para provimento de vagas e formação de cadastro de reserva para o quadro da Petrobrás (edital nº 1/2005, Edital – PETROBRAS/PSP-RH), cujo edital foi expedido pela Gerência Executiva de Recursos Humanos.
                            Foi aprovada em 14º (décimo quarto lugar) para o cargo de Administrador Pleno, com pólo de trabalho em São Mateus do Sul (PR).
                            No dia 02.01.2007 a apelante recebeu ligação telefônica em que foi avisada de que haveria vaga para ser aproveitada na cidade de São Paulo (SP), sendo consultado o seu interesse, pois era pólo de trabalho diverso daquele para a qual havia sido aprovada. Estabelecidas tratativas via e-mail, recebeu telegrama para que comparecesse na unidade de Araucária para tratar da vaga.  
                            Em Araucária entregou sua documentação e assinou (após solicitação) o termo que possibilitaria seu aproveitamento no pólo diverso.
                            Desde então, nunca mais foi contatada pela empresa Petrobrás (por qualquer meio).
                            De início se imaginou que a vaga não tivesse sido liberada, e que esse seria o motivo de não haverem mais contatos. Passado algum tempo, tentou obter informações junto à Petrobrás via telefone e via e-mail, mas também não obteve resposta, permanecendo ignorada.
                            Isso perdurou até que se descobriu que a Petrobrás estava disponibilizando na internet informações sobre a última classificação convocada para admissão. E ao consultar tais informações, para sua surpresa, a atualização realizada em 9.3.2007 dava conta de que o 20º colocado já havia sido convocado para admissão no pólo de trabalho de São Mateus do Sul.
                            Foi apenas e exclusivamente por isso que a apelante tomou conhecimento de que foi preterida e ignorada na admissão.
                            A impetrante nunca foi comunicada formal e oficialmente (e sequer informalmente) de que teria sido desclassificada. Nunca lhe foi dada ciência administrativamente acerca do exame de seu processo de admissão. Não houve qualquer informação sobre o motivo de não ter sido admitida.
                            Em seguida (em conversas com outras pessoas que na época concorriam em concursos públicos) a impetrante ouviu notícias informais de que a Petrobrás estaria exigindo que os administradores, para que tomassem posse, tivessem três anos de experiência contados a partir da formatura.
                            A partir disso a impetrante suspeitou de que esse fosse o motivo de não ter sido chamada para a admissão. Não tinha certeza quanto ao motivo, pois nunca foi intimada do correspondente ato administrativo que seria necessário para tanto.
                            Foi diante desse quadro que a apelante impetrou o mandado de segurança: para sanar a omissão (consistente na ausência de ato administrativo de desclassificação comunicado à candidata aprovada) e para suprir o ato comissivo (preterição na ordem de classificação). Almejou, assim, que em sede de total concessão da segurança tivesse assegurada a sua admissão na função de “Administrador Pleno”.
                            Foi somente durante o trâmite do mandado de segurança que a Petrobrás juntou um documento em que haveria a “análise” da documentação apresentada pela impetrante para admissão, da qual se infere que o motivo de sua preterição seria mesmo a questão dos três anos se limitarem exclusivamente ao período posterior à colação de grau.   
                            Veio a sentença de denegação da segurança, fundada em exclusivamente um argumento: o de que período de três anos de experiência deveria ser computado apenas depois da colação de grau.
                            Em razão principalmente da omissão da sentença quanto aos demais fundamentos da impetração foram opostos embargos de declaração, que restaram rejeitados.  
                            E agora se interpõe o presente apelo, com o objetivo de que a sentença seja reformada integralmente ou, quando menos, parcialmente.


II. FUNDAMENTOS PARA A REFORMA DA SENTENÇA
                            Há inúmeros fundamentos para a reforma da sentença. E, como se observará adiante, qualquer um dos fundamentos apresentados por si só já seria suficiente a autorizar a reforma da sentença, o que se dizer então no caso, em que todos eles se fazem presentes inclusive concomitantemente. Passa-se a apresentá-los. 

2.1- Ausência de ato administrativo de desclassificação da candidata. Violação aos princípios da legalidade, da publicidade e da motivação. Explícita ofensa ao artigo 37, caput, da Constituição e ao artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, VII, VIII e X, da Lei n. 9.784/99.   
                            A Petrobrás nunca editou ato administrativo que decidisse pela eliminação ou pela desclassificação da apelante. Nunca houve um ato existente, válido e eficaz a esse respeito.
                            Houve apenas um único documento consistente em uma “ata de reunião” referente à avaliação de experiência profissional. Mas ato administrativo nunca existiu.
                            A “ata de reunião”, que (pasme-se!) conta até com “anotações” manuscritas (contrariando o modo impresso do restante do documento; aliás, sem esforço é possível constatar que a anotação de “tempo exigido no edital – 3 anos” é posterior à própria assinatura do documento, pois está claro que a rubrica no canto inferior direito foi anterior à escrita manuscrita, tanto que a escrita até desce ao se aproximar da rubrica, para com ela não se misturar), não consiste em ato administrativo de eliminação ou desclassificação.
                            A própria “ata de reunião” em nenhum momento aplica decisão de eliminação ou de desclassificação. A ata se limitou a mencionar não estar cumprido requisito do edital, sem qualquer conteúdo decisório.
                            Nenhuma das autoridades competentes para a decisão de eliminação ou desclassificação participou da reunião e também nenhuma dessas autoridades editou ato posterior decidindo a esse respeito. De se dizer que se apresenta óbvio que as autoridades competentes seriam apenas o Presidente da Petrobrás (por congregar os poderes administrativos em seu grau máximo na organização), o Gerente Executivo de Recursos Humanos (que é o competente pelo quadro de pessoal e que inclusive foi o cargo responsável pela abertura do edital) ou o Presidente da Comissão de Concurso.
                            Traçando-se uma comparação com um concurso da magistratura, seria como se um candidato aprovado em todas as fases do concurso não pudesse tomar posse no cargo de juiz porque em uma mera “ata de reunião” um juiz substituto (não integrante da comissão de concurso) e um técnico judiciário resolvessem que o aprovado “não comprova o atendimento dos requisitos do edital” e isso valesse por si só, sem necessidade de nenhuma decisão pela autoridade competente e muito menos de qualquer comunicação ao candidato aprovado.
                            Com a devida vênia, é mais do que claro o absurdo da situação.  
                            E aqui é importante assinalar que a decisão de primeiro grau ao julgar os embargos de declaração beirou a teratologia.
                            Com o devido respeito, não soa racional que o argumento de omissão (inexistência de ato administrativo e inexistência de comunicação dele pelo meio previsto no edital) somente teria relevância acaso houvesse pedido de abertura de prazo para a defesa no procedimento administrativo.
                            Se um dos objetos do mandado de segurança era justamente o de sanar a omissão (objeto esse expresso e reiterado em inúmeros trechos da petição inicial) quer parecer ser indubitável que mesmo a própria necessidade de análise administrativa do caso pela autoridade competente (o que nunca houve) e eventual defesa administrativa estão contidos no bojo de tal pretensão.
                            Aliás, como se poderia esperar um pedido inicial cem por cento preciso e ipsis literis se a impetrante sequer tinha conhecimento efetivo do que havia ocorrido. Todas as vezes em que ela tentou obter informações junto à Petrobrás foi solenemente ignorada. E inclusive essa conduta omissa foi um dos motivos ensejadores do mandado de segurança e do próprio pedido de que a omissão fosse sanada.
                            Guardadas as devidas proporções, é como se uma pessoa que está doente e desconfiando estar com câncer procurasse um hospital público, fizesse exames e depois houvesse negativa do hospital em informar ao paciente o diagnóstico (com o intuito de não ter que ministrar o tratamento). Daí a pessoa procurasse a tutela jurisdicional para suprir a omissão do hospital público e para obter o tratamento para o câncer, e depois fosse surpreendida com uma sentença em que se dissesse que como na verdade a doença seria outra (diabetes, por exemplo), o pedido seria improcedente, já que somente a possibilidade de tratamento para o câncer precisasse ser apreciada.
                            Data venia, é uma forma de se tentar tapar o sol com a peneira. É como se dizer que existe uma grande ilegalidade, mas que dá para fechar os olhos para ela porque o pedido da petição inicial não foi exatamente desse modo e com enorme especificidade a esse respeito.
                            Mas ora, se havia uma omissão, como poderia a impetrante saber exatamente o que poderia obter, já que as pessoas com o conhecimento disso (a Petrobrás) sequer lhe informavam a razão de ter sido ela “esquecida”. A impetrante foi completamente ignorada pela Petrobrás e, para maior tristeza, foi de volta completamente ignorada pela sentença.       
                            De todo modo, como o pedido maior era o de que se assegurasse a admissão da recorrente na função de “Administrador Pleno”, é certo que esse pedido maior abrange também seus conteúdos intrinsecamente integrantes, como o de que fosse editado ato administrativo existente, válido e eficaz que implicasse no exame de sua admissão ou eliminação. Ou seja, no mínimo a segurança poderia ter sido concedida em parte para que a Petrobrás, pela autoridade competente, fosse obrigada a examinar e decidir efetivamente acerca da admissão ou eliminação da ora apelante.
                            Pelo argumento contido na rejeição dos embargos de declaração, nenhuma demanda judicial poderia ser julgada parcialmente procedente, pois somente existiria a procedência ou a improcedência do pedido. É de clareza solar que a decisão de primeiro grau de jurisdição beira as raias do absurdo.
                            E mesmo com a determinação de que um ato administrativo existente, válido e eficaz fosse emanado pela autoridade competente o resultado, em tese, deveria ser o de admissão da recorrente no cargo, já que haveria de se aplicar um desdobramento da teoria do fato consumado, na medida em que atualmente (antes mesmo da edição do ato administrativo correspondente) a recorrente conta com mais de seis anos de experiência profissional depois da conclusão do curso superior (e mais de dez anos de atividade de administração de empresas). Com efeito, é também por desdobramento da inteligência à súmula n. 266 do Superior Tribunal de Justiça que os requisitos exigidos devem ser apurados ao tempo da posse no cargo.
                            Toda essa conduta omissa da Petrobrás ofende os princípios da legalidade, da publicidade e da motivação, implicando em ofensa ao artigo 37, caput, da Constituição e ao artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, VII, VIII e X, da Lei n. 9.784/99.          

2.2- Ausência de comunicação oficial quanto à desclassificação da candidata. Violação aos princípios da legalidade e da publicidade. Gritante ofensa ao artigo 37, caput, da Constituição e ao artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, V, VIII e X, da Lei n. 9.784/99. Óbvia violação ao item 10.3 do Edital do concurso.
                            Está escrito no item 10.3 do Edital do concurso que o candidato que viesse a ser eliminado na fase de comprovação dos requisitos deveria ser informado sobre sua situação por via postal.
                            A impetrante nunca foi comunicada pela Petrobrás de sua eliminação, quanto mais pela via postal. Até porque, como já se viu, nunca houve sequer ato administrativo de eliminação, de modo que não poderia ser comunicada de algo que nunca existiu.
                            Houve explícita violação à regra do edital. Como cediço, o edital é a “lei do concurso”. Se a “lei do concurso” foi violada e a recorrente não foi comunicada a respeito de eliminação, torna-se inafastável a ofensa ao item 10.3 do Edital do concurso, com sua correspondente ofensa aos princípios da legalidade e da publicidade, previstos no artigo 37, caput, da Constituição e no artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, V, VIII e X, da Lei n. 9.784/99.
                            Ou seja, quando menos se deveria conceder em parte a segurança para que um ato administrativo seja editado e dele a impetrante seja intimada nos moldes previstos no edital. Não se pode compactuar com a violação ao ordenamento jurídico. Se houve ilegalidade, deve ela ser suprida, sob pena de se fomentar a adoção de condutas ilegais justamente por quem deveria dar exemplo (a administração pública), o que intrinsecamente consistiria em ofensa ao próprio pacto social e demonstraria como é insípida a “república democrática” existente no Brasil. Novamente aqui não se pode, tal como fez o juízo de primeiro grau, buscar um sofisma para chancelar a manutenção da conduta ilegal.
                            É válido lembrar que a própria Petrobrás não nega que tenha violado o item 10.3 do Edital, pois não demonstra que tenha emitido a comunicação à recorrente da forma como prevista no edital. Pelo contrário, o exame de sua conduta permite inferir antes uma confissão de violação ao edital, pois sequer houve ato administrativo de eliminação da recorrente, tendo a administração se limitado a uma mera “ata de reunião”, sem conteúdo decisório e sem envolvimento de quaisquer das autoridades competentes.
                            Também aqui se aplicam as observações do tópico anterior quanto à concessão no mínimo parcial da segurança, bem como quanto ao desdobramento da teoria do fato consumado e da inteligência à Súmula n. 266 do STJ.

2.3- Conduta nebulosa da Petrobrás tanto no edital quanto após a aprovação da candidata, o que ofende a probidade e a boa-fé que se espera em todas as relações humanas e principalmente nas jurídicas. Flagrante ofensa aos artigos 113, 187 e 422 do Código Civil, ao artigo 37, caput, da Constituição e ao artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, II, IV e IX, da Lei n. 9.784/99.
                            Excelências. O edital em nenhum momento foi explícito no sentido de que se exigiria que os três anos de atividade fossem contados a partir da conclusão de grau. Pelo contrário, como destacado na inicial, o seu exame sistemático conduz até mesmo à conclusão oposta (de que atividades profissionais de administração de empresas seriam computadas, ainda que sem diploma). Caso o edital tivesse sido explícito ou claro a esse respeito, ao ser a recorrente contatada pela Petrobrás poderia ter pedido reposicionamento em final de lista, situação essa bem comum e admitida em todos os concursos públicos, o que lhe possibilitaria reunir todos os requisitos nebulosamente exigidos pela Petrobrás ao tempo em que então tomaria posse no cargo.   
                            Depois, mesmo a impetrante tendo sido aprovada especificamente para o pólo de trabalho de São Mateus do Sul (PR), foi chamada pela Petrobrás para pólo diverso, em São Paulo (SP). Em nenhum momento foi alertada de que se assim aceitasse somente seria contado o tempo de experiência posterior à conclusão do curso superior. Se soubesse disso ou se tivesse sido oportunamente alertada quanto à “ata de reunião”, poderia ter recusado o aproveitamento no pólo diverso, quando então poderia esperar que surgisse vaga no pólo para o qual tinha sido aprovada, quando então poderia talvez já contar com o preenchimento de todos os requisitos ou, caso ainda não contasse, poderia pedir o reposicionamento em final de lista.
                            Todavia, além de a Petrobrás ter agido de forma nebulosa no edital e quando do possível “aproveitamento” em pólo diverso, passou a agir de modo ainda mais estranho e obscuro depois que a recorrente efetuou a entrega da documentação na unidade de Araucária. A partir de então ela passou a ser solenemente ignorada. Suas tentativas via telefone e e-mail em descobrir e ser informada a respeito do que estava acontecendo foram de todo desconsideradas. Nenhum ato administrativo de sua eliminação do concurso foi editado e nem mesmo o edital de concurso foi cumprido, pois ela não foi comunicada pela via postal sobre sua situação.     
                             Como se nota, esse modo de agir da Petrobrás em total desconsideração da recorrente, não se coaduna com a probidade e com a boa-fé que deve reger todas as relações humanas e, principalmente, as relações jurídicas de direito público. Há nítida violação à boa-fé que inspira o ordenamento jurídico (e que pode ser constatada a partir da inteligência aos artigos 113, 187 e 422 do Código Civil), e, por conseguinte, resulta também ofendida a legalidade e a moralidade que devem nortear as autoridades públicas, consoante prevê o artigo 37, caput, da Constituição e o artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, II, IV e IX, da Lei n. 9.784/99.
                             Pior. Além de toda essa violação à boa-fé, como se viu acabou a Petrobrás por tolher direitos legítimos da impetrante, como o de aguardar que surgisse vaga no pólo de trabalho para o qual tinha sido aprovada ou o de pedir o reposicionamento em final de lista, oportunidades essas que dentro do prazo de validade do concurso permitiriam com que tomasse posse no cargo e atendesse a todos os requisitos que foram nebulosamente exigidos pela Petrobrás. Em vez de ter seus direitos esclarecidos e assegurados, foi induzida a optar por outro pólo de trabalho diverso daquele para o qual havia sido aprovada, antecipando a sua chamada para então ser surpreendida com a sua desclassificação (desclassificação que, relembre-se, foi operada sem ato administrativo propriamente dito, por quem não detinha competência a tanto e cuja providência sequer lhe foi comunicada nos moldes exigidos pelo edital).

2.4- A não-recepção da restrição da Lei n. 4.769/65 (que prevê o exercício da profissão de administrador exclusivamente por bacharéis em Administração) pela Constituição da República Federativa do Brasil (artigo 5º, inciso XIII, da Constituição). A derrogação do artigo 3º, alínea “a”, da Lei n. 4.769/65 pelo Código Civil (art. 1.011, § 1º, do Código Civil). A inteligência ao entendimento do Supremo Tribunal Federal para profissão com características análogas (artigo 5º, caput, da Constituição).
                            A sentença de primeiro grau entendeu que os três anos de experiência profissional somente poderiam ser contados exclusivamente a partir da conclusão do curso de Administração.
                            De fato, o artigo 3º, alínea “a”, da Lei n. 4.769/65 prevê que o exercício da profissão de administrador é privativo dos bacharéis em Administração. Todavia, com a devida vênia, tal dispositivo não foi recepcionado pela Constituição Cidadã de 1988 e até mesmo se encontra derrogado pelo Código Civil.
                            É que a comparação realizada pela sentença dos administradores com os médicos (como fez a sentença) ou com os engenheiros (como fez a Petrobrás em sua peça de bloqueio) se apresenta de todo incompatível. Tais profissões são incomparáveis, pois ninguém duvida que um médico precise de qualificação técnica para poder diagnosticar doenças e lidar com vidas, assim como um engenheiro precisa de qualificação técnica para exercer sua responsabilidade técnica sobre obras de engenharia (que em caso de acidente poderão também destruir vidas).
                            Mas a administração de empresas é bem diferente. Claro que um curso superior amplia o conhecimento técnico, mas ele não é requisito essencial para que sejam desempenhadas as atividades de administração.
                            Tanto é assim que o Código Civil apenas prevê que as pessoas jurídicas em seu registro declarem o modo pelo qual são administradas e representadas (artigo 46, inciso III); que no contrato social sejam mencionadas as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, seus poderes e atribuições (art. 997, inciso VI); que a administração da sociedade pode competir separadamente a cada um dos sócios (art. 1.013); que o administrador pode ser nomeado por instrumento separado ao contrato social, quando então deverá requerer a averbação à margem da inscrição da sociedade (art. 1.012); que apenas não podem ser administradores as pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos, ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato, ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação (art. 1.011, § 1º). E existem mais inúmeras previsões no Código Civil a demonstrar que a administração pode ser exercida por qualquer pessoa.
                            Ou seja, qualquer pessoa natural que não se encontre nas vedações do art. 1.011, § 1º, do Código Civil pode ser administradora. Logo, é fácil inferir que aquela previsão do artigo 3º, alínea “a”, da Lei n. 4.769/65 é incompatível com o atual Código Civil, de modo que aquela restrição do desempenho da profissão de administrador por bacharel em Administração se encontra derrogada.  
                            Para espancar qualquer dúvida, até mesmo o Conselho Regional de Administração do Paraná admite a inscrição como profissional em seus quadros dos tecnólogos, os quais não são bacharéis. Isso pode ser constatado pela internet no seguinte endereço:
                            <http://www.cra-pr.org.br/documentos/documentos_reg%20prof%20tecnologo_principal.html
                            Inclusive, a própria Presidência da Petrobrás consiste em um cargo de administração. Aliás, é o maior cargo de administração dentro da Petrobrás, pois administra os rumos da companhia, os demais administradores e todos os demais cargos. E o ilustre Presidente da Petrobrás, senhor José Sergio Gabrielli de Azevedo, segundo se extrai das informações sobre o seu currículo existentes na internet, tem formação em Economia. Ou seja, não é ele graduado em Administração. Então, pelo raciocínio da sentença e defendido pela Petrobrás nos presentes autos, o próprio Presidente da Petrobrás se encontraria na ilegalidade, pois estaria desempenhando uma função de administrador sem atender à “exigência” do artigo 3º, alínea “a”, da Lei n. 4.769/65.
                            Mais. A maior função administrativa no Brasil é, sem dúvida, a Presidência da República. E é interessante lembrar que em um passado próximo o Presidente da República (que esteve à frente da administração do país por oito anos) também não tinha curso superior. Ao revés, era uma pessoa semi-alfabetizada e que tinha por formação educacional um curso técnico no SENAI em tornearia mecânica.
                            Ou seja, pelo raciocínio da sentença e defendido pela Petrobrás nos presentes autos, o ex-Presidente da República e o próprio atual Presidente da Petrobrás, tão-só pelo fato de estarem administrando um país e uma sociedade de economia mista estariam praticando uma ilicitude, já que nenhum deles cumpre a “exigência” do artigo 3º, alínea “a”, da Lei n. 4.769/65.
                            E é ululante (pedindo aqui escusas pelo trocadilho) que assim não o é.
                            Então, a melhor comparação entre profissões não é dos administradores com os médicos ou com os engenheiros, mas sim com os jornalistas.
                            Qualquer pessoa pode desempenhar o jornalismo e adquirir experiência profissional nessa área, mesmo sem diploma ou até mesmo sem qualquer estudo. Assim como qualquer pessoa pode administrar empresas (sejam públicas, privadas ou de economia mista), mesmo sem diploma ou até mesmo sem qualquer estudo.  
                            Por isso merece destaque que o Supremo Tribunal Federal já entendeu por diversas vezes que as profissões de jornalismo não exigem diploma, assim o fazendo, por exemplo, ao julgar o Recurso Extraordinário 511961/SP (Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 17.6.2009). É que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (artigo 5º, inciso XIII, da Constituição), somente sendo possíveis exigências de qualificação profissional se houver um fator discriminador que a justifique.
                            E onde há a mesma razão, aplica-se o mesmo direito. Ora, se a administração tem contornos semelhantes ao jornalismo no aspecto do desempenho profissional, a decisão do STF deve ser estendida e aplicada também aos administradores. Cuida-se, a rigor, de aplicação do princípio da isonomia (artigo 5º, caput, da Constituição).          
                            Como já ao tempo da impetração e da entrega da documentação a apelante era bacharel em Administração e como contava com cerca de cinco anos de experiência profissional (pois administrava sociedade empresária desde 10 de março de 2002), torna-se necessária a conclusão de que preenchia o requisito para ser admitida e tomar posse no cargo.

2.5- A invalidade da exigência dos três anos de atividade prevista no edital, máxime ao ser ela interpretada de modo a restringir de forma ainda maior a nebulosa exigência. Ofensa ao princípio da legalidade, à democracia e do livre acesso aos cargos e empregos públicos, previsões essas presentes no artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, III, VI e XIII, da Lei n. 9.784/99; no artigo 1º, caput, no artigo 5º, caput, inciso II, no artigo 37, caput e incisos I e II, todos da Constituição.
                            A exigência de três anos de experiência profissional (e aqui é bom não confundir com a atividade jurídica para a carreira da magistratura, pois para ela existe expressa previsão constitucional a respeito, diversamente do caso em tela, no qual se está diante de uma exigência restritiva criada de modo nebuloso pelo edital e sem a existência de qualquer lei prevendo essa exigência de três anos de atividade profissional de administração após a conclusão de grau), e, pior, contados após a formatura em curso superior, mostra-se ilegal e inválida perante a Constituição.
                            A Constituição, em seu artigo 37, inciso I, prevê que os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei. E, no inciso II prevê que a investidura depende de aprovação prévia em concurso público. Da combinação dos dois incisos citados infere-se o princípio do livre acesso aos concursos e empregos públicos, cuja exegese é a de que todos os brasileiros podem ter acesso a cargos públicos, podendo para tanto participar do concurso público respectivo.
                            Em decorrência, mostra-se incompatível com o ordenamento jurídico a existência de qualquer restrição ou interpretação restritiva que limite o acesso ao emprego ao critério do exercício de três anos de atividade após a conclusão do curso superior. Como já antecipado, isso seria possível se estivesse previsto na Constituição ou em lei; mas não está!
                            Admitir-se tal restrição seria ofender a democracia. Isso porque esta se expressa no Congresso Nacional, onde o povo, por seus representantes eleitos, atua na elaboração das leis.
                            A comissão de concurso e as autoridades dos mais altos cargos da Petrobrás não têm função e competência legiferante. Não podem restringir o que a própria Constituição e a lei não restringiram. Qualquer restrição veiculada é ilegal e inválida. Admitir-se qualquer outro pensamento seria o mesmo que ofender o princípio democrático.
                            No ordenamento jurídico brasileiro somente lei formal e em sentido estrito é hábil criar ou restringir direitos. Somente a lei pode inovar originariamente no ordenamento jurídico ou alterá-lo. Apenas se permite aos órgãos administrativos (integrantes da Administração Pública, direta ou indireta) a edição de regulamentos executivos. Em outras palavras, há vedação de que a Administração expeça normas autônomas de conteúdo restritivo de direitos, sem respaldo em lei.
                            E foi isso que ocorreu no caso. Já o edital não podia restringir o direito de livre acesso à função, tendo estabelecido inadequadamente a exigência de três anos. E, ainda pior, os agentes da sociedade de economia mista não podiam ampliar ainda mais as restrições, de modo a exigir que os três anos fossem contados somente após a formatura no curso de administração.
                            De se assinalar que mesmo se houvesse lei prevendo uma restrição de que o cargo de Administrador Pleno somente pudesse ser exercido por pessoa com três anos de atividade profissional (e contada depois da conclusão de grau) – o que não há! – ainda assim essa lei seria inválida, pois como já se viu, não haveria um discrímen válido, porquanto em um país em que o Presidente da República e o próprio Presidente da Petrobrás sequer precisam ser administradores formados, com muito mais razão não se há como exigir que um administrador formado e aprovado para o cargo de Administrador Pleno tenha que ter três anos de experiência profissional e contados a partir da colação de grau.
                            Assim, ao interpretar a nebulosa exigência do edital como sendo apenas após a colação de grau, o que não estava expresso no edital do concurso, houve violação à regra do artigo 2º, parágrafo único, inciso XIII, da Lei n. 9.784/99, na medida em que diante da obscuridade da regra editalícia se deveria dar a interpretação mais consentânea com a principal finalidade pública dos concursos (a seleção dos melhores candidatos, o que se dá com a própria ordem de classificação no concurso).
                            E, além de se dar interpretação ainda mais restritiva, a própria conduta de se ter imposto a restrição dos três anos de experiência se apresenta inválida e ilegal. Ofende o princípio da legalidade, a democracia e o livre acesso aos cargos e empregos públicos, axiomas esses contidos no artigo 2º, caput e parágrafo único, incisos I, III, VI e XIII, da Lei n. 9.784/99; no artigo 1º, caput, no artigo 5º, caput, inciso II, no artigo 37, caput e incisos I e II, todos da Constituição.

III. CONCLUSÃO E PEDIDOS
                            Diante do exposto, roga-se ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região que a situação da apelante não seja mais uma vez ignorada. Já se vão cerca de seis anos desde a abertura do concurso e apesar de a apelante ter sempre agido de boa-fé e dado sempre pronto atendimento a todas as determinações que lhe foram dirigidas, até hoje não teve solução para sua angústia. Deseja-se que o ordenamento jurídico seja prestigiado e que os cristalinos direitos a que faz jus a apelante não sejam novamente olvidados. Por todos os motivos aqui apresentados, requer-se a Vossas Excelências a reforma integral da sentença. Quando menos, espera-se a reforma parcial ou a anulação da sentença para que outra seja proferida com apreciação efetiva de todos os argumentos que foram apresentados pela impetrante.  
“De tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, o homem chega a rir-se da honra, desanimar-se de justiça e ter vergonha de ser honesto” (Rui Barbosa).
                            Nesses termos, pede-se deferimento.
                            De São José dos Pinhais para Curitiba, 16 de novembro de 2011.

                            ROSANA MARIA VIDOLIN MARQUES
                            Advogada – OAB PR 23.025   

4 comentários:

  1. Este eu já conhecia!

    ME

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  2. Quando sair a sentença do caso, se for possível doutor, poste-a aqui para sabermos o desfecho final da situação.

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  3. Postarei sim.
    Mas, infelizmente, imagino que o acórdão manterá a denegação da segurança (apesar de a situação ser de clara violação ao ordenamento jurídico). A Justiça Federal e o TRF da 4a Região (Sul) têm uma certa tradição de "paternalismo" do "Estado" em temas de concursos públicos.
    É mais provável que o caso somente receba desfecho de concessão da segurança no STJ, tribunal esse que tem o costume de ser mais coerente com o Direito nos casos de concursos públicos.
    :S

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  4. Tudo bem então doutor.
    Levando-se em conta esse "paternalismo" da justiça federal e do TRF da 4ª Região em temas de concurso público, bem provável que seja denegada a segurança. Enquanto isso, fica a requerente frustrada, vendo seus Direitos violados mais uma vez, esperando da justiça uma resposta à altura, que se assim ocorrer, como bem dito por vossa excelência, mais provável que venha do STJ.
    Muito obrigado doutor.

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