24 de julho de 2011

Drama cinematográfico


2ª Vara Judicial da Comarca de DRACENA
Ofício Cível
Autos nº 168.01.2006.004322-2/000000-000
448/06

SENTENÇA:
M e I ajuizaram a presente causa em face de A e de H, pretendendo, em síntese: a) a exibição do contrato celebrado entre as partes, que está na posse dos requeridos; b) a inversão do ônus da prova nos termos do artigo 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor; c) a rescisão do contrato entres as partes e a anulação das notas promissórias; d) a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 8.124,00; e, e) a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais, a ser arbitrada judicialmente.
Para tanto, alegam ter contratado os serviços da empresa requerida através do Sr. H, que lhes agenciara condições dignas de trabalho em outro país, Japão.
Nada obstante terem os autores cumprido todas as formalidades exigidas para poderem viajar, e assim iniciarem as atividades laborais, ao chegarem ao Japão não foram bem recepcionados e, posteriormente, foram despedidos - razão pela qual tiveram que desocupar o imóvel que lhes fora prometido.
Após a desocupação, os autores foram encaminhados para outra cidade, com a promessa de um emprego em condições menos favoráveis que no último; recusada a oferta (por conta das condições desfavoráveis apresentadas), permaneceram no Japão, sem saber falar o idioma daquele país e sem ter para onde ir. Somente depois, com muito esforço, por intermédio de seus familiares no Brasil, conseguiram um lugar para permanecer até a volta à pátria. Outrossim, informam ter emprestado dinheiro da genitora do requerido, no valor de R$ 7.000,00, para poder voltar.
Ainda: ao chegarem ao Brasil, mais especificamente nesta cidade, procuram a empresa requerida e o requerido, mas não tiveram êxito em perceber o que gastaram, e muito menos lhes foi dada qualquer satisfação.
Deram à causa o valor de oito mil, cento e vinte quatro reais. Juntaram documentos (fls. 11/41).
O co-réu H ofereceu contestação, argüindo preliminarmente sua falta de legitimidade, pois é apenas representante da empresa requerida; no mérito, pugnou para que: a) não seja acolhida a inversão do ônus da prova, pois não se trata de relação de consumo; e, b) que sejam julgados improcedentes todos os pedidos feitos pelos autores (fls. 73/89). Juntou documentos (fls. 90/122).
Réplica a fls. 158/169.
A co-ré A ofereceu contestação argüindo uma questão preliminar e, no mérito, alegou que: a) não seja acolhido o pedido de inversão do ônus da prova, e, b) que seja indeferida qualquer pretensão de indenização por danos morais ou materiais aos autores (fls. 124/140). Juntou documentos (fls. 141/156).
Réplica a fls. 170/182, com novos documentos (fls. 183/190).
Saneador a fls. 193/4.
Em audiência, foram colhidos os depoimentos pessoais dos autores (fls. 275/291 e fls. 292/306), além de serem ouvidas duas testemunhas dos autores (fls. 307/311 e 312/314) e duas do co-réu H (fls. 316/322 e fls. 323/329).
Houve mais juntada de documentos pelos autores (fls. 338/346).
Por carta precatória, foi ouvida uma testemunha da co-ré A (fls. 362/363).
Encerrada a instrução processual (fls. 385), vieram aos autos as alegações finais das partes (fls. 387/402, 418/426 e 427/429).
                   É o relatório.
                   DECIDO.
                   Antes de tudo, determino o desentranhamento dos documentos juntados com as alegações finais dos autores (fls. 403/408), porque intempestivos.
                   Não se tratando de documentos novos e uma vez encerrada a fase probatória, não cabe à parte trazê-los somente agora, em momento que se destina, tão-só, a fazer uma digressão sobre tudo que foi exposto e colhido durante a marcha processual.
                   Assim, proceda a Serventia à entrega ao n. patrono dos autores; decorridos trinta dias, inutilize-os.
                   No mais, procede em parte o pleito dos autores.
                   É dos autos que a co-ré A obrigou-se a: 1) transportar os autores ao Japão; 2) arranjar-lhes emprego no Japão; e, 3) arranjar-lhes moradia, durante suas estadas, no Japão.
                   A própria contestação acostada a fls. 124/140 não nega tais deveres; antes, afirma tê-los cumprido, imputando condutas faltosas aos autores, os quais teriam abandonado o emprego na empresa K, levando, assim, ao justo desligamento de ambos do quadro de funcionários de referida firma contratante.
                   Ocorre, porém, que a co-ré A não se desincumbiu a contento do ônus de comprovar a exceção substantiva oposta, deixando de trazer aos autos qualquer prova do abandono de emprego referenciado a fls. 132.
                   Ao revés, a própria secretária da co-ré A asseverou, em testemunho consignado a fls. 362, o seguinte:
“(...) recorda-se que os autores tiveram problemas no Japão porque o Sr. M, segundo a empresa K informou para a depoente, não estava conseguindo acompanhar o serviço que lhe era exigido na empresa, de modo que foi demitido.” (destaquei)
                   Essa versão corrobora os fatos sustentados pelos autores em sua petição inicial, quais sejam: de que na quinta-feira se apresentaram na fábrica da K, na sexta iniciaram o trabalho e, no sábado, M foi demitido (fls. 04, quarto e quinto parágrafos).
                   Claro que a ré A não pode se obrigar a garantir o emprego, mas sim em consegui-lo. A permanência nele depende, fundamentalmente, do esforço do próprio trabalhador.
                   Entretanto, isso não a desobriga de mínimas obrigações de zelo, transparência e diligência, para resguardar a boa-fé contratual e a ética entre todos os envolvidos na relação jurídica negocial havida.
                   Com efeito, fácil seria à ré captar clientes no Brasil, induzi-los a aceitar empregos no Japão em prazos e condições excelentes, e, uma vez no exterior, depois de um ou dois dias na empresa, serem esses mesmos clientes demitidos.
Para todos os efeitos, teria a ré cumprido seu dever contratual.
                   O raciocínio, formalmente, está correto. Materialmente não, porque não se coaduna com as melhores regras do Direito, enquanto Ciência da Convivência Ordenada, e tampouco com o espírito de Justiça.
                   Note-se que, mesmo em se tratando de uma obrigação de meio, isso não desobriga a ré A de agir com diligência em prol do interesse de seus contratantes – até porque, e isso é cediço, ninguém contrata senão diante de uma necessidade, que não é o meio em si, mas o fim a que ele se destina.
                   Sobre a distinção entre obrigação de meio e obrigação de resultado, com sua diferença de tratamento no campo probatório, disserta com absoluto acerto Paulo Lôbo, a saber:
“Tal distinção doutrinária não mais se sustenta, pois contradiz um dos principais fatores de transformação da responsabilidade civil, ou seja, a primazia do interesse da vítima. Por outro lado, estabelece uma inaceitável desigualdade na distribuição da carga da prova entre as duas espécies: na obrigação de meio, a vítima não apenas tem de provar os requisitos da responsabilidade civil para a reparação (dano, fato causador, nexo de causalidade, imputabilidade), mas que o meio empregado foi tecnicamente inadequado ou sem a diligência requerida, o que envolve informações especializadas, que o autor do dano dispõe e ela não; na obrigação de resultado, basta a prova dos requisitos. O tratamento desigual para danos reais, em virtude da qualificação do conteúdo da obrigação como de meio ou de resultado, conflita com o princípio constitucional da igualdade, que é uma das conquistas modernas da responsabilidade civil.” (Teoria Geral das Obrigações. SP: Saraiva, 2005, p. 34)
                   E prossegue o renomado autor:
“Afinal, é da natureza de qualquer obrigação negocial a finalidade, o fim a que se destina, que nada mais é que o resultado pretendido. O resultado é o interesse do credor. (...) Assim também pensa a doutrina portuguesa, cuja crítica demonstra o ‘fracasso da distinção’, com o argumento de que ‘mesmo nas obrigações de meios existe a vinculação a um fim, que corresponde ao interesse do credor, e que se o fim não é obtido presume-se sempre a culpa do devedor’.” (Ob. cit., p. 35)
                   Busca-se sempre, portanto, o bem da vida; in casu: trabalho, por meio de uma agência especializada nesse serviço.
Justamente por isso, inviável a tese levantada pela combativa Defesa, trazendo jornais e revistas, no sentido de que seria fácil ao autor conseguir novo emprego, máxime porque já possui anteriores passagens pelo Japão.
                   Ora, se dessa vez ele buscou uma empresa especializada na colocação de dekasseguis no mercado de trabalho japonês, foi porque não se sentiu hábil para, sozinho, realizar essa empreitada. E as experiências anteriores comprovam-no.
                   Aliás, a co-ré A não apenas deixou de comprovar o abandono de emprego por parte dos autores (ou ao menos do autor, já que a autora assume isso, em solidariedade ao marido), como também não juntou aos autos a realização dos indispensáveis exames médicos e laboratoriais que diz ter realizado – e necessários para a colocação de ambos no severo mercado de trabalho japonês.
                   Com efeito, nos autos há, somente, as declarações unilaterais dos autores, nos cadastros preenchidos no ano de 2005 (fls. 141 e 146).
                        Cadastros nos quais, diga-se, não constam os resultados dos testes de aptidão, hanamaru, matemática e de pinos, causando estranheza à vista das sinceras palavras da testemunha L, consignadas a fls. 328, sexta a oitava respostas [“J: Antes de ir para o Japão fez exames de saúde pela A, laboratório? D:. Completo. J:. Em Dracena? D:. É. J: Psicotécnico também? D:. Fizemos, na A têm um teste lá.” (sic)].
                   Até porque, “sendo não (a resposta dos exames e testes) não embarca” (fls. 329, primeira resposta).
                   É dizer: não agiu a co-ré de modo diligente com os autores: 1) seja porque aparentou ter arranjado um emprego a ambos, quando em verdade conseguiu-o apenas a um (a autora); 2) seja porque os indicou a uma empresa (K) que descumpriu o avençado (fls. 144, item 5; fls. 147, item 5 [Prazo de duração mínima do contrato de trabalho, de um ano]), demonstrando - a ré A - negligência com seus contratantes e indiferença com os resultados dos contratos; ou, 3) seja porque não providenciou a documentação necessária (exames médicos, laboratoriais e psicotécnicos) para a mantença do autor na empresa K ou no mercado de trabalho japonês.
                   Logo, é inescusável a conclusão de que a co-ré A inadimpliu a obrigação a que estava adstrita, dando causa aos danos experimentados pelos autores. Nem se esqueça que ela infringiu, também, o dever de boa-fé objetiva, norteador das avenças firmadas em nossa sociedade.
                  Com efeito, a ré faltou com diversos cuidados em relação à outra parte do contrato: descurou do seu dever de respeito, falhou com o imperioso dever de agir conforme a confiança depositada e não foi leal, ao escolher empresa (K) tão intempestiva e oscilante; além disso, deixou de colaborar ou cooperar para que o problema fosse equacionado, no Japão; e, por fim, agiu de forma totalmente desarrazoada, não entregando a documentação que diz ter providenciado, aos autores (os propalados exames) [A respeito do princípio da boa-fé objetiva e de seus deveres anexos: TARTUCE, Flávio. ‘Função social dos contratos. Do código de defesa do consumidor ao novo código civil’. São Paulo: Método, 2005].
Cai como luva, aqui, a seguinte lição, de Caio Mário da Silva Pereira, verbis:
“O fundamento primário da reparação está, como visto, no erro de conduta do agente, no seu procedimento contrário à predeterminação da norma, que condiz com a própria noção de culpa ou dolo. (...)” [Instituições de Direito Civil, vol. II. RJ: Forense, 2006, p. 371. Negritei]
A ré, com seu erro de conduta, descumpriu o preceito contido no art. 422 do Código Civil, a saber:
“Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Sobre o alcance desse dispositivo, na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal, em 2002, enunciou-se o seguinte:
“Enunciado n° 24: Art. 422: em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa.” (Destaquei.)
“Enunciado nº 170: Art. 422: A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato.”
Aliás, isso reforça o comando normativo exarado pelo art. 187 do CC, in verbis:
“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
                  E digo autores, estendendo o inadimplemento à senhora I porque, nada obstante ela não tenha sido demitida, inexistia solução outra para ela senão a de deixar o emprego, afinal: a) estava no Japão, com seu marido; b) ambos foram para trabalhar, juntos; c) ambos estavam no apartamento da empresa K (fls. 142 e 146); d) o custo de vida naquele país, conforme repisado nos autos, é bastante alto, não sendo possível apenas a uma pessoa manter os dois, máxime em moradia vinculada a um emprego não mais pertencente ao sr. M.
Acima de tudo, porém, legitima a conduta da esposa do autor o princípio da solidariedade familiar, de forte conteúdo ético, “que contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a reciprocidade”, segundo magistério de Maria Berenice Dias [Manual de Direito das Famílias. SP: Revista dos Tribunais, 2006, p. 56].
E essa solidariedade familiar torna-se imperiosa numa relação conjugal, na qual marido e mulher prometem união em todas as vitórias e em todos os dissabores da vida.
Dessa forma, é passada a hora do princípio da solidariedade, constitucionalmente consagrado (arts. 3º, incisos III e IV, 226, 227 e 230, todos da CF), matizar as condutas em sociedade, justificando-as, lastreando-as e embasando-as, notadamente aquelas relacionadas à família, tornando eficaz a vontade popular, expressada pelos constituintes originários.
Assim, estabelecido o inadimplemento contratual por parte da A, resta certo o ilícito por ela perpetrado, donde surge a obrigação de reparar os danos causados.
Comprovados nos autos (fls. 16/19, 31/34 e fls. 40) os seguintes danos materiais:
a) passagens de ônibus.............................................. 322 reais [Fls. 17 e 19];
b) notificação da ré.................................................... 63 reais [Fls. 34].
Tudo somado, chega-se ao montante de 385 reais, atualizado monetariamente desde cada desembolso, pela tabela prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com juros moratórios à razão de 1% ao mês, incidindo do mesmo termo a quo.
Acolho a impugnação de fls. 137, no tocante ao valor das passagens aéreas: com efeito, o documento juntado a fls. 16 não consigna qualquer valor; ademais, até mesmo em razão do carbono, está quase ilegível; por fim, não tendo os autores explicado como chegaram ao valor requerido (sete mil reais), seria temerária uma decisão que condenasse a ré a um valor tão alto, sem uma prova segura, certa.
Demais disso, havendo impugnação ao documento particular juntado, incumbia aos autores a prova de seu conteúdo, isto é, de que pagaram sete mil reais pelas passagens.
Sobre a força probante dos documentos particulares, ensina João Carlos Pestana de Aguiar Silva [As provas no cível. RJ: Forense, 2003, p. 170/1. Destaquei], verbis:
“O valor probante do documento particular se distingue do valor probante do documento público. Isso porque possui este último a presunção de autenticidade, que lhe dá o atributo de fé e confiança erga omnes, enquanto que confere a lei ao primeiro a presunção de veracidade em relação ao signatário. A presunção de autenticidade pode ser elidida, desde que produzida prova concludente a respeito, da alçada daquele que impugnou o documento público. Já a presunção de veracidade cede diante da simples impugnação, cabendo o ônus da prova àquele a favor de quem se apresenta o documento particular.”
Por outra, rejeito a impugnação da ré no tocante às passagens de ônibus, porque não teria ela “responsabilidade pelos autores morarem onde moram” (fls. 137, sic). Ora, a finalidade da responsabilização civil é volver os autores ao status quo ante; assim, é juridicamente lógico que a ré responde pelos gastos efetuados pelos autores para voltarem a seu lar.
Quanto aos lucros cessantes, pleiteados na forma de dois salários mínimos, pelo mês que os autores ficaram afastados do Brasil, não exercendo suas funções de feirantes, aplico o art. 302, caput, in fine, do CPC, porque não foram precisamente impugnados.
E, para além da presunção estabelecida, mister consignar que as testemunhas E e C afirmaram conhecer os autores da feira, não sendo crível que ali trabalhassem sem perceber, ao menos, a mínima remuneração nacional.
Por essa razão, é justo que lhes seja indenizado o mês perdido de trabalho, aqui no Brasil, onde exerciam a profissão de feirantes. A cada um dos autores, estabeleço como indenização pelos lucros cessantes o valor do salário mínimo à época dos fatos (outubro de 2005), qual seja: 300 reais, atualizado monetariamente desde então, pela tabela prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com juros moratórios à razão de 1% ao mês, também a partir da data acima (outubro de 2005).
Finalmente, passo a analisar os danos morais,
“Assentando, então, como premissa, que o Direito brasileiro atual admite seja indenizado o dano moral, tanto o originário de obrigação contratual quanto o decorrente de culpa aquiliana (...)” [Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil, v. II. RJ: Forense, 2006, p. 378]
O dano moral visa à reparação de uma dor profunda, de um ataque à própria dignidade humana.
Tende a compensar aquela conduta que provoca um sentimento atormentador, cujos efeitos perduram no espírito do cidadão, causando-lhe transtornos emocionais, indignação, vexação, humilhação, sentimento de menoscabo ou, ao menos, sérios e injustificados aborrecimentos.
Por essa razão, o ordenamento jurídico busca uma compensação financeira, vez que a recomposição do status quo ante é impossível em tais hipóteses.
Evidencia-se, portanto, que a conduta da ré, ao inadimplir sua obrigação contratual, ao arranjar emprego tão precário ao autor, dificultando até mesmo a vinculação de sua parceira (a autora), provocou inegáveis danos morais.
Ora, não se pode negar que gera aflição, desespero, angústia e medo ficar desempregado, no dia seguinte ao início do contrato de trabalho, num país do outro lado do mundo, sem dinheiro, sem amigos e sem apoio do núcleo familiar mais próximo.
Pior: perder a chance que lhe fora oferecida, não possuir mais moradia (porque o apartamento era funcional, isto é, da empresa, cf. fls. 142/144 e 146/148) e endividar-se para retornar ao país de origem.
Quanto à autora, induvidosa sua angústia, ao ver o consorte demitido sem causa aparente, forçando-a a sair do emprego, para que pudessem tentar algo em conjunto.
Essa situação, em outro país, causada por negligência da ré, causou inequivocamente abalos psíquicos e emocionais nos autores, que nem mesmo precisariam ser demonstrados.
A esse respeito:
“DANO MORAL – Caracterização. Prova. Propagação do fato ofensivo. Desnecessidade. O dano moral resulta de íntimo sentimento, ferido por qualquer injustiça praticada, não sendo mister a propagação de fato desonroso à pessoa. O dano moral carece de prova, mas as regras de experiência permitem ao juiz considerá-las como efeito do próprio fato ofensivo. A distinção entre dano material e dano moral não decorre da natureza do direito, mas do efeito da lesão, do caráter de sua repercussão sobre o lesado, como observa Aguiar Dias, que, recorrendo à lição de Minozzi, conclui que o dano moral deve ser compreendido em seu conteúdo, que é a dor, o espanto, a emoção, a injúria física ou moral sofrida, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuído à palavra dor o mais largo significado.” (TAMG – AC 325.925-4 – 5.ª C. – Rel. Juiz Ernane Fidélis – DJMG 10.04.2001)
Nada obstante, houve a juntada do receituário médico de fls. 338/345 (referentes ao autor), além dos testemunhos prestados a fls. 309 e 313, relatando choros da autora.
Consigne-se, ainda, o evidente estado depressivo do autor, quando esteve em Juízo e prestou seu depoimento pessoal, demonstrando raciocínio lento, olhar perdido e pouca compreensão dos fatos.
Tudo isso escancara, sobejamente, os danos ocasionados aos autores, em razão do não cumprimento contratual pela co-ré A.
Como inexiste um critério definido para o cálculo da reparação de dano puramente moral, é ela arbitrável judicialmente.
E, tendo em vista critérios afetos à causa em apreço, tais como a gravidade da conduta da ré, a extensão dos danos provocados nos autores, e os tormentos por eles sofridos no Japão, fixo a indenização em 90.000 reais, valor esse equivalente a trezentas vezes o salário mínimo da época (300 reais) – tudo a ser atualizado monetariamente pela tabela prática do TJ/SP e acrescido dos juros moratórios legais (1% ao mês), a contar da citação.
A ré tem plenas condições financeiras para suportar o pagamento da indenização, que repara plenamente os danos causados aos autores, tanto do ponto de vista compensatório, como do punitivo.
Nesse passo, não convence o argumento de sua possível falência, porque seu capital social é diminuto. Prática empresarial vezeira, tais atos constitutivos mudam ao talante dos sócios da empresa, conforme a intenção de contrair débitos ou limitar responsabilidades. Sendo vezeira, não pode o Judiciário ignorar.
Por fim, cabe dizer que tudo quanto aqui foi exposto, como claramente se percebe, diz respeito à pretensão dos autores em face da co-ré A.
Quanto ao co-réu H ficou estabelecido, desde a irrecorrida decisão saneadora, da necessidade de aferir sua condição de mandatário e se agiu com excesso ou abuso de poder, no exercício do mandato que lhe fora outorgado pela co-ré A (fls. 193, ponto 3).
Encerrada a instrução, nada obstante se possa dizer que o sr. H agiu em nome da empresa ré, não se pode afirmar tenha abusado ou excedido de seus poderes, limitando-se, apenas, a oferecer os préstimos daquela, e que foram livre e espontaneamente aceitos pelos autores.
Nem se pode dizer que a parte do serviço a seu encargo (recolhimento das assinaturas dos autores e obtenção do visto nos passaportes) tenha causado os danos sentidos pelos demandantes.
Sua conduta, nesse passo, não possuiu qualquer relevância causal para o surgimento dos danos experimentados pelos autores, razão por que não há elementos para responsabilizá-lo.
Pois bem.
Com tudo que se viu, leu, analisou e lançou, resta claro que, conquanto válidas as notas promissórias levadas a protestos, são elas inexigíveis, nos termos do art. 476 do Código Civil.
É preciso deixar claro: não é caso de anulação, porque os títulos são válidos, preenchendo todos os requisitos dos atos jurídicos estabelecidos pela lei civil brasileira. Todavia, não podem ser exigidos nos valores em que apresentados a protesto, porque, à vista da exceção do contrato não cumprido, deveria a ré discriminar como chegou ao valor de R$ 8.052,00 para cada um dos autores.
Não o fazendo oportuno tempore (a contestação é omissa quanto a essa pretensão) [Mais uma vez: art. 302, caput, in fine, Código de Processo Civil], acolhe-se o pleito inaugural, rescindido os contratos entre as partes e tornando inexigíveis as notas promissórias a eles vinculadas, razão pela qual torno definitiva a liminar dada na cautelar de sustação de protesto para, em caráter definitivo, cancelar os atos mencionados nos autos nº 168.01.2006.003413-0/000000-000 (342/06).
Dessa forma, ante todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES as pretensões ajuizadas por M e I, motivo pelos quais condeno a co-ré A a pagar aos autores: a) como indenização pelos danos materiais sofridos, a importância de R$ 385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais), comum a ambos, atualizada monetariamente desde cada desembolso, pela prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com juros moratórios à razão de 1% ao mês, incidindo do mesmo termo a quo; b) como indenização pelos lucros cessantes, a importância de R$ 300,00 (trezentos reais), a cada um, atualizada monetariamente desde outubro de 2005, pela tabela prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com juros moratórios à razão de 1% ao mês, também a partir dessa data; e, c) como indenização pelos danos morais que lhe foram acarretados, a importância de R$ 90.000,00 (noventa mil reais), comum a ambos, valor esse equivalente a trezentas vezes o salário mínimo da época (trezentos reais), tudo a ser atualizado monetariamente pela tabela prática do TJ/SP e acrescido dos juros moratórios legais (1% ao mês), a contar da citação. Improcede a pretensão dos autores no que toca ao ressarcimento dos gastos havidos com as passagens aéreas de volta (Japão ao Brasil), porque não comprovados. Declaro rescindido os contratos firmados entre as partes e, conseqüentemente, inexigíveis as notas promissórias a eles vinculadas, razão por que cancelo os protestos mencionados nos autos nº 168.01.2006.003413-0/000000-000 (342/06).
Condeno a ré, sucumbente, ao pagamento das custas e das despesas processuais, bem ainda à verba honorária da parte vencedora, ora fixada em 20% sobre o valor da condenação.
Fixo o percentual no máximo, atentando para: a) a qualidade dos serviços dos patronos dos autores, irreprochável; b) a necessidade de ampla instrução probatória, inclusive com oitiva de testemunhas por deprecata; c) o tempo de duração da demanda; d) a complexidade fática e jurídica da presente causa; e, e) a remuneração dos serviços prestados na ação cautelar de sustação de protesto.
IMPROCEDE, porém, a pretensão dos autores em face do co-réu H, razão pela qual condeno-os a pagar as custas e as despesas processuais desse co-réu, bem ainda a verba honorária de sua í. Patronesse, que fixo, por eqüidade, em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), atento às mesmas circunstâncias elencadas no parágrafo antecedente.
Essa fase se encerra com fulcro no art. 269, I, do Código de Processo Civil.
Traslade-se cópia desta sentença aos autos nº 168.01.2006.003413-0/000000-000 (342/06), cuja extinção ora determino, pelos mesmos fundamentos legais aqui esposados (art. 269, I, CPC).
P. R. I. C.
Dracena, 10 de dezembro de 2008
Bruno Machado Miano
Juiz de Direito

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